quinta-feira, 18 de fevereiro de 2016

"Viagem a Itália"


Pois que não ia por lã, não poderei dizer que volto tosquiado. Mas fui à procura do que ainda não encontrei. O viajante, bom teutónico, alarga-se em considerandos sobre os solos da paisagem e a física deles, os cursos de água, os recortes das montanhas imponentes, e a natureza das nuvens que os ornamentam. Tão objectivo quanto maçador. 
Mas quando encontra o sol, as pessoas e a vida delas, não resiste: Kennst Du das Land who die Zitronen blühen? Traduzido assim: "Eu, porém, delicio-me mais com a fruta, os figos e as pêras, que devem ser deliciosas, em terras onde já crescem limoeiros."

« Verona, 17 de Setembro (...) Num país em que gozamos o dia, mas sobretudo nos alegramos com a chegada da noite, este momento tem um significado muito especial. O trabalho suspende-se, o passeante regressa a casa, o pai quer a filha de volta ao lar, o dia chega ao fim; mas nós, os Cimérios,*** mal sabemos o que é o dia. Mergulhados em eternas névoas cinzentas, é-nos indiferente saber se é dia ou noite; pois quantas horas podemos nós verdadeiramente deliciar-nos ao ar livre? Quando aqui chega a noite, o dia ficou decisivamente para trás, delimitado por crepúsculo e aurora, passaram vinte e quatro horas, abre-se uma nova página, os sinos tocam, reza-se o terço, de lamparina acesa entra a criada no quarto e diz: "Felicissima note!" (...)
Se obrigássemos este povo a viver ao ritmo de ponteiros alemães, ele ficaria confuso, porque os seus estão intimamente ligados à sua natureza mais funda. (...)»

***Na mitologia grega, povos das terras sombrias do Norte, referidos por este nome já em Homero.
[J. W. Goethe, Viagem a Itália 1786/1788, Liv. Bertrand Edit. Lisboa 2016]