"A uns 50 quilómetros a Norte de Lisboa, para lá da Serra de Sintra, fica a vila de Mafra. As suas casas parecem miniaturas, diante duma enorme estrutura setecentista, um convento barroco construído durante o reinado de D. João V (1706- 1750) cujas colunas e abóbadas gigantescas são visíveis de quilómetros em redor. A imponente fachada, flanqueada por duas torres sineiras, domina a área, mas esconde a verdadeira dimensão do complexo, que se estende para trás, através de 40 mil m2 de celas de monges, capelas, aposentos e salões de banquete.
No entanto, o projecto começou de forma muito modesta, quando o rei ordenou a construção de um convento singelo, em acção de graças pelo nascimento dum herdeiro. Originalmente destinava-se a abrigar apenas treze frades franciscanos, e em 1717 só algumas centenas de pedreiros iniciaram a construção do edifício.
Sete anos mais tarde, doze mil camponeses acampavam numa área que em breve se tornou o maior estaleiro de obras da Europa. Em 1730 a força de trabalho aproximava-se dos 50 mil homens, o equivalente à população duma grande vila do séc. XVIII. Os custos cresceram, mas o tesouro real pagava tudo, encomendando mármores italianos em rosa, branco, azul, amarelo e negro. Os fabricantes de sinos de Liège e Antuérpia ficaram tão surpreendidos com o tamanho da encomenda recebida de Portugal que puseram em dúvida a quantidade. Mas a seu tempo mais duma centena de sinos seria forjada e transportada através da Europa até Portugal.
Percorrendo milhares de quilómetros através do Oceano Atlântico, até ao Brasil, e depois mais uns 500 Kms para o interior até à região hoje conhecida por Minas Gerais, encontrava-se a maior fonte de receitas para a extravagância de Mafra. Aí, nos primórdios do sistema colonial, homens, os seus escravos e ajudantes índios raspavam o solo, cavavam minas rudimentares e peneiravam as correntes, na primeira corrida ao ouro da era moderna. Nos primeiros anos as condições de vida eram horríveis - os campo auríferos situavam-se em território não desbravado, e as provisões eram insuficientes para as sucessivas vagas de prospectores. Mas, à medida que as obras de Mafra avançavam, o ouro em pó atravessava o oceano. Em breve diamantes e pedras preciosas eram desenterrados e embarcados para a Europa, indo as taxas alfandegárias referentes à sua venda encher os cofres da coroa.
Com entradas de dinheiro cada vez maiores, provenientes das colónias..."
[Patrick Wilcken, Ed.Civilizaçao, 2005]