sexta-feira, 31 de agosto de 2012

Quem sabe...

... é que explica! Mesmo quando prega aos peixinhos.

Questão de escala

A violência e o terror na dose adequada neutralizam os povos, como a história já mostrou.
Subindo sempre a parada, a desfaçatez e a falta de vergonha conseguem o mesmo efeito, como hoje podemos ver. É apenas uma questão de escala, e os Relvas sabem-no bem.

Hoje é assim!

É pá desgraça!

Penhora

Azar dos Távoras foi o daquele polícia da esquadra da Damaia! Destacado para Olhão numa campanha estival, tropeçou em dois maduros que traficavam cavalo. Logo ali os algemou!
O juiz agendou o julgamento e mandou-os aguardar em liberdade. Naturalmente eles não compareceram.
E deste modo não figurava nos autos quem pagasse as custas do processo... a não ser o polícia da Damaia. Não tendo melhor escolha, o meretíssimo penhorou ao agente o domicílio constante dos autos, que era a esquadra de polícia da Damaia.

quarta-feira, 29 de agosto de 2012

Era uma festa!

Riem alguns pategos, que andaram na privada.

Já sentia a falta de ouvir na televisão uma voz que também já foi governo e não me faz sentir nojo

RTP a partir do minuto 13.

Como se fosse a mãe deles!

Este governo de cafres iletrados, quase todos filhos dum sertão qualquer, em lugar de edificá-la, de facto emporcalha, avilta e degrada a nossa vida. 
O Relvas então é uma vergonha tal que já tem vergonha de si próprio. Manda uns avençados a falar por ele.
E a propósito da RTP, são os avençados que pedem a demissão da administração. Põem a pátria na praça, como se fosse a mãe deles.

Pontos de vista privados, dirás tu!

E não era mau que fossem!
O problema é que são verdades fundas. E não termos nós consciência delas é-nos fatal. Como a história já muitas vezes mostrou.

terça-feira, 28 de agosto de 2012

O sr. François Hollande baixou as calcinhas

"Peço à oposição síria que forme um governo provisório, que possa ser o legítimo representante da nova Síria".

A Síria só não é uma nebulosa, porque tudo nela é um filme já visto. As primaveras árabes ridentes, os rebeldes coitadinhos a chorar pela democracia, e a pedir bombas da NATO que os protejam dum déspota que se diverte a dizimar o seu povo, as ameaçadoras armas químicas, tudo isto, no todo ou em partes, reedita a Tunísia, o Egipto, a Líbia, e segue um plano.
E o que nele mais surpreende é ver o sr. Hollande, que apareceu aí a exibir auréolas luminosas, a pegar nas deixas de Sarkozy e a enlamear a França.
O que está em causa na Síria são interesses energéticos e geo-estratégicos ocidentais em volta do golfo Pérsico. São as políticas imperiais e criminosas da América, que achincalha a ONU sempre que lhe convém, que põe a NATO a render quando lhe dá jeito, que procura a salvação impossível acelerando em frente, que despreza os povos da Europa e não hesita em lançá-los à fogueira, com a cumplicidade das respectivas elites dirigentes.
É a eterna questão de judeus e palestinos, que o Ocidente nunca resolverá. É o Irão e as centrais nucleares. São as enormes reservas de petróleo, simples e barato. É a manutenção do dólar como moeda internacional, o único factor que ainda o sustenta.
O direito de intervenção humanitária, esse conceito criado pela América e os seus títeres europeus, é a gazua que lhes faltava para destruírem países soberanos e nos calarem a boca.
Entretanto as vidas dos povos atacados retrocedem décadas, enquanto deslizam para o fanatismo das sociedades teocráticas.
As Torres Gémeas, o Afeganistão, o Iraque, a Líbia, a Síria, o Irão, são peripécias sucessivas dum crime que está em marcha e não tem final feliz. Nem para o mundo nem para nós.

segunda-feira, 27 de agosto de 2012

Utopia

Mas que há nela um forte aroma a realidade... lá isso há!

Ecos 15***

Aqui há uns tempos fui visitar a última fragata da carreira da índia, ancorada ali à doca dos olivais. E regressava a casa, quando encontrei no pátio o cavalo d’el-rei dom sebastião.
Eu não queria acreditar no que via. O decrépito estado do corcel jogava a seu favor, mas só me conformei ao ouvi-lo jurar pelos santinhos que se chamava cá-vai. É que nem toda a gente conhecerá o pormenor. Ainda infante, trotava el-rei nos corredores do palácio, montado num rinchão de pau amarelo, cá-vai cavalo, cá-vai cavalo. Um dia o jesuíta privou-o do ginete, enquanto ele não rezasse as penitências, e o infante nunca mais recuperou do trauma. Mal se viu armado cavaleiro, logo baptizou desse nome o corcel predilecto.
Não me restava escusa, entendereis pois que eu tenha ficado pregado à calçada. Mas logo aproveitei para saber da batalha de alcácer, onde cada cabeça dá sua sentença. O velho ginetre não precisou de muita corda para começar a falar, e foi assim que disse.
Passado a vau o uéde mocassim, mandou el-rei assentar arraiais e pernoitar. Castelhanos na hoste havia muitos, e terços de italianos e teutões, gente azougada que por toda a santa noite folgou e tangeu alaúdes, só não entenderá quem nunca respirou os túrbidos ares das campanhas de além-mar.
Na manhã seguinte, à hora da alvorada, o arrebol apareceu ensanguentado. Pediu el-rei ao céu um compasso de espera, perante o mau agoiro, mas logo uma vasta moirama começou a agitar alfanges e estandartes por detrás da colina fronteira. Ainda uma vez el-rei mandou suster o levantado afã, mas a tropa já lá ia, só já pôde gritar cá-vai cavalo.
No meio de tão desencontrados falares, ninguém percebeu a algaravia suplicante dos perros de mafoma, enquanto morriam como pardais. Mas o pior foi a grande hecatombe que viria depois, quando a hoste do mulei almélico, nos finais da manhã, tomou posições na charneca. Foi tarde demais que alguém deu pelo enredo, afinal o mouro aliado é que provara o vigor dfas nossas lanças.
Ora se é verdade que um engano qualquer um pode ter, ademais perante perros que são todos iguais, assim embrulhados nas jilabas, não é menos verdade que ninguém vai à ceifa depois de fazer a malha, rematou sagazmente o velho pégaso. Ninguém nos pôde ali valer, e quando el-rei deu de peito num virotão certeiro, começou a escorregar-me pela ilharga e foi morrendo devagar. Ao ver assim a pátria moribunda, eu fiz cara ao deserto e dei às de vila-diogo, de venta aberta às aragens de arzila.
O velho corcel tinha o indiscutível ar sisudo que assumem os cavalos quando falam da história. Mas eu não podia aceitar uma cartesianice destas, já via os meus melhores mitos a naufragar. E logo eu, que todas as noites acendo um archote à janela, para alumiar el-rei que há-de chegar na escuridão. Há dias em que é melhor não vir à rua. Corri a alimária do pátio à sabrada e nunca mais acendi o farol.
[***Ecos de 2002]

domingo, 26 de agosto de 2012

Ó Seguro!

Imagina tu que eu era, lagarto, lagarto, o Pedro Passos Coelho, quando tu te pões a balbuciar que o primeiro-ministro tem que explicar aos portugueses como é que vai ultrapassar não sei o quê, do acordo com a troika.
Que havia eu de fazer, senão mandar-te bardamerda e virar-me para o outro lado?!

Com vénia!

Sempre me surpreendeu, até que o percebi, este facto curioso: por esse país afora, mais rural ou mais urbano, mais ilustrado ou primário, mais mouro ou mais celtibero, em tudo o que seja estanco, pastelaria, café, balcão de zinco ou de pedra, taberna, esplanada, e às vezes um restaurante, lá está o omnipresente Correio da Manhã. Disponível à leitura dos clientes.
Sempre me surpreendeu, porque o CM, como órgão de informação, está muito abaixo de cão. É um vómito indigesto, um concentrado de toxinas mentais, que faz fundir os neurónios mais capazes.
Porquê então?!
Cheguei a pensar tratar aqui o assunto. Mas vista a coisa assim tão claramente, e vindo tão a propósito, porquê ter esse trabalho?!
Faço um LINK, com uma vénia muito grande!

Olha que beleza!

Não te esqueças de agradecer a um deus qualquer, enquanto vais clicando!

sábado, 25 de agosto de 2012

As nossas elites

No maior esplendor!

A vilanagem

Em roda livre!

Mercado genial

Mesmo quando aplicados ao Ecce Homo, os princípios estéticos da pós-modernidade são garantia de sucesso no mercado.
É isso que demonstra, sem qualquer surpresa, o caso da curiosa de Borja.
Quem atentar no génio do Hirst, no génio do Koons, e no dos outros farsantes da família, por que há-de surpreender-se com o génio duma devota?!

Escavando um pouco

E usando uma boa máscara, acaba por se encontrar o cadáver do Relvas.

Prendas

Este governo é a última das prendas que o PPD ofereceu ao país, nos últimos trinta anos. Nele há bêbados e náufragos, todos igualmente pulhas.
Há bêbados de poder e de deslumbramento pacóvio, de ignorância e de primarismo crasso, de incapacidade e de impreparação nunca vistas.
E há náufragos que decoraram o manual das teorias, e o puseram em prática, e até voltaram a lê-lo, e à custa do país já viram que não funciona.
Uns e outros já perderam o pé, e só três coisas os mantêm à tona. 
Um presidente da República que nunca esteve à altura do cargo, e os aguenta à falta de melhor.
Uma oposição que vive do mais fraquinho que o PS tem.
E o desespero, ou o medo, ou a inconsciência que já tolheu o povo e o anestesia, metido na camisa de forças de penúria que lhe vestiram.
O resultado é este apodrecimento. O Relvas já nem sequer assume as malfeitorias que tutela e engendra. Manda um boneco por ele.
Quem dera que isto fosse uma farsa! Mas é a nossa tragédia!

Provavelmente

Provavelmente já não nos lembramos do que foi feito, e do que foi dito, e por quem, aquando da assinatura do acordo com a troika, há um ano e meio atrás.
Provavelmente já não nos lembramos, porque não passamos dumas bestas que têm o que merecem.
Provavelmente já não nos lembramos, porque só guardamos no bestunto a última aldrabice que ontem nos impingiu na televisão um cabrão qualquer de serviço.
Provavelmente já não nos lembramos, por pensarmos que já não vale a pena lembrá-lo.
Mas é mentira! É indispensável relembrá-lo aqui, e não o esquecer. Para entender o calibre dos filhos da puta com quem estamos metidos.

sexta-feira, 24 de agosto de 2012

Se podes ler, repara!

E aprende, enquanto podes!

Vergonha

Com as suas mezinhas tóxicas e os seus missais cabalísticos, estes aprendizes de feiticeiro, estes filhos iletrados dum sertão qualquer que nos governam, lá vão demolindo a pátria, lá vão terraplanando a vida e o futuro.
Lembrar-me eu que o comité central, e outros aventureiros secundários, abriram alas para esta gente aceder ao poder, é uma ideia que me causa vergonha. Não sei donde a vergonha me vem. Mas não consigo deixar de a sentir.

quinta-feira, 23 de agosto de 2012

Instantâneos 7

Alberto João Jardim não é inimputável, não é um jumento que zurra desabrido, não é um matóide inculpável, um oligofrénico, uma asneira em forma de humanóide, um erro hilariante da natureza.
Alberto João Jardim é um infame sem remissão, e o poder absoluto de que dispõe faz com que proceda como um canalha, a merecer adequado correctivo».
Baptista-Bastos, a propósito do referendo que a bestiaga esgrime. Se esta pátria não fosse o que é, já o tinha oferecido há muito aos leões marinhos. 

quarta-feira, 22 de agosto de 2012

Ecos 14***

Não fosse ele o raio da esquizofrenia, já mo disse um doutor, era caso para dizer que não queria outra vida. Mas foi duro, a princípio, ter que aprender tudo do nada.
Eu era ainda puto quando a minha mãe me trouxe ali para o bairro, havia pretas de luanda a trabalhar a dias, malta de cabo verde nas obras da ponte, uma confusão do caraças. Todos os dias andava por ali uma chusma de malta ao cheiro do produto, alguns vinham mesmo ressacados, pareciam zombies a apanharem do lixo restos de algodão, caricas de frascos, bocados de limão. E eu sempre me dei melhor com a malta que se ficava por umas ganzas, curtia umas linhas uma vez por outra e aguentava-me como podia, era conforme dava a grana.
É tudo sempre uma questão de grana, de papel, aprendi-o desde cedo, a vida era difícil e eu tive que começar pelo mais simples. A chavalada da secundária passava lá ao fundo na azinhaga, era aconchegar-lhes ao pescoço uma seringa qualquer apanhada do lixo, e era vê-los largar os telelés, as parcas, uns pintores, às vezes os jeans com que tapavam o rabinho.
Quando a bófia começou a rondar o sítio, era tempo de mudar de estratégia e dar de frosques. E um esticão a preceito, lá para são paulo, se o tipo da gilera estava disponível, não tinha que saber. Ora velhotas a cair da tripeça, ora madamas que se punham a armar ao herói, e que lá tinham de ir ao chão.
O chato é que a certa altura os dias são todos parecidos, e um tipo quer sempre mais. Tive que me iniciar com quem sabia nas artes da gazua, e cheguei a um ponto em que bastava chegar ao pé do fiat, rosnar um abracadabra e ficar a ver a porta abrir-se, cheia de respeitinho. Mas a certa altura já ninguém aceitava as bodegas dos leitores de cassetes, as bodegas dos rádios antigos, a certra altura já ninguém aceitava mesmo as bodegas dos carros. O que os chefões queriam agora era materiais modernos, digitais, leitores múltiplos, com altifalantes surraunde. Mas isso vinha trancado nessas fortalezas que chegaram aos montes da europa, com fechaduras de cofre-forte, imobilizador electrónico e lugar guardado em garagem. Aí as coisas complicaram-se.
Houve uma noite em que cheguei a embarcar numa loucura. Uns tipos totalmente passados, que já tinham estado num reformatório, chegaram ali numa bomba vermelha que ficou na rua a trabalhar um ror de tempo, por causa da chatice da ligação directa, enquanto se combinava o trabalhinho. Havia uns gajos que tinham caçadeiras de canos serrados, e um preto que vinha lá das colónias andava com uma pistola de calibre de guerra, um tipo encaixa um balázio daqueles no peito e vai desabar a metros de distância, foi o que aconteceu ao gasolineiro nessa noite. A coisa até rendeu, só que eu achei aquilo artilharia demais para mim. O meu forte foi sempre a leveza de meios da guerrilha, por isso voltei à táctica da seringa. Um betinho qualquer, uma caixa multibanco, dois tiques de ombro a meu modo, era vê-los a digitar o código e a abrir mão do saldo disponível.
Mas já se sabe que a concorrência em demasia dá cabo do mercado. Todo o bairro andava num desassossego, e os tipos da televisão ninguém os calava sempre a assustar o pessoal, sempre a exigir policiamentos, vigilâncias, superesquadras. E foi no alargamento dos quadros que achei a solução do duplo emprego. Fui admitido num concurso para a bófia, desde então trabalho de dia num campo e de noite no outro. A situação melhorou, não se pode dizer o contrário, não fora a chatice da esquizofrenia e eu não queria realmente outra vida. É que de dia sou clandestino a singelo, porque não posso dizer o que faço à noite. E à noite sou clandestino em dobrado, por não poder dizer o que faço, nem de noite nem de dia.
Ultimamente tem-se falado muito do regime de exclusividade para toda a malta, parece que sempre é verdade andar meio mundo a enganar outro meio. Eu não sei ainda o que vou fazer, é preciso ver bem em que param as modas. Em todo o caso, o pior de tudo será andar no meu trabalho, uma noite destas, e dar de caras comigo mesmo, com a farda da autoridade. Não é que me tem andado a passar a cena pela cabeça?!
[***Eco de 2002]

Uma pequena ponta da verdade

Numa meada confusa e muito mal explicada.

domingo, 19 de agosto de 2012

Toma lá um último fadinho, pimpão, fatalista, marialva e vazio!

Cumpre o fadário decadente que uma elite parasita te reserva, e tá caladinho!

Uma pátria de enjeitados

1 - A dívida da Câmara da Guarda é de 70 milhões. Qual seja a vitalidade empresarial, industrial e económica da cidade, e o desemprego da sua população activa, não sabemos. Mas imaginamos, se nos pusermos a olhar à nossa volta.
2 - A Câmara da Meda inaugurou o Poli-desportivo Municipal da Cidade (!), um projecto que envolveu um investimento total elegível de 1,3 milhões, co-financiado em 951.720 € pelo FEDER. O pavilhão surge integrado num Parque de Infraestruturas Desportivas e de Lazer, do qual fazem parte o estádio municipal, o complexo municipal das piscinas com interior aquecida e exterior de ar livre, o parque de campismo, o parque radical e o minicampo de futebol. Destina-se a dotar o concelho da Meda de um pavilhão para a prática de actividades lúdico-desportivas, proporcionando aos seus habitantes melhor qualidade de vida. Qual seja a população total do concelho da Meda, a faixa etária predominante, e a sua capacidade de produção de riqueza, não sabemos. Mas claro que imaginamos. 
3 - A Câmara de Trancoso vai inaugurar em Outubro o Centro de Interpretação da Cultura Judaica, um projecto que custou 1,2 milhões e pretende contar a história da comunidade que viveu em Trancoso nos séculos XV e XVI. O equipamento foi projectado pelo arq. Gonçalo Byrne, e está-se neste momento na fase de concepção dos conteúdos multimédia que vão enriquecer o espaço. Os visitantes vão poder encontrar informações sobre os 700 processos de judeus naturais e residentes em Trancoso que foram vítimas da Inquisição, e também elementos sobre os cerca de 300 sinais cruciformes existentes no município. A abertura do Centro será um acontecimento marcante não apenas para Portugal mas também para Israel.
4 – Trancoso tem hoje criadas praticamente todas as condições para ser atractivo, enquanto produto turístico vendável com relativo sucesso. Para concluir essa estratégia, falta-nos apenas o Museu da Cidade (!) no Palácio Ducal (o qual já custou ao cofre camarário um pouco menos de um milhão). O projecto está em curso (no atelier de Gonçalo Byrne, é mais que certo), e estou convencido que poderemos pô-lo em marcha, e esse seria o último equipamento para culminar a estratégia de desenvolvimento turístico de Trancoso.
5 – A parceria publico-privada feita pela Câmara de Trancoso foi lançada para um conjunto de sete equipamentos, quando o QREN estava atrasado. Dos sete equipamentos executámos apenas três, que nunca poderiam ser financiados pelos fundos comunitários. Fizemos a Central de Camionagem, o Campo da Feira e o Centro Cultural de Vila Franca das Naves. Retirámos da parceria o Museu Judaico e o Museu da Cidade, tendo-se desistido do Museu do Tempo, porque não havia condições financeiras para o fazer. Em causa ficaram 8,5 milhões, a pagar em 25 anos, com encargos anuais de cerca de 800.000€. Não sabemos qual seja a população do concelho, (talvez 9 mil boas almas), nem quanta dela voltou à emigração, nem que riqueza específica produz, nem quantas vezes abrirá por ano o Centro de Vila Franca, nem o que acontecerá ao rossio da feira se um dia os encargos não forem liquidados. Não sabemos, mas claro que imaginamos.
6 – A última reforma administrativa do território, tão antiga como o Mouzinho da Silveira, já tem uma eternidade. E era urgente uma nova reforma, porque o mundo entretanto mudou muito: para tornar mais racional a nossa vida colectiva, e para combater esta hidra delirante de autarcas megalómanos e fantasistas, que anda há muito a procurar os caminhos do progresso, percorrendo os atalhos da nossa decadência. A hidra possui incontáveis cabeças. E quanto mais elas são, mais variam as formas da ruína.
7 – Esta troika que nos aperta a cilha, e que estas falsas elites de serventuários mandaram vir para tratar das nossa dívidas, sabia à partida que uma forma de reduzir a despesa era cortar à hidra algumas das cabeças. Por isso impôs aos relvas a reforma do poder local. E o Relvas ainda fez os primeiros ensaios.
Mas quando falou na redução de municípios caiu-lhe o Carmo em cima. O poder dos municípios, principal esteio e razão de ser do PPD, não podia tolerar que lhe mexessem no quintal. E à voz do Ruas logo o Relvas se calou. A reforma administrativa ficou limitada à extinção de mil e tal freguesias. E deste modo, pela mão do Relvas, em lugar de se fazer o que deve ser feito, far-se-á o que não devia acontecer.
A poupança de três milhões é insignificante e desprezível no cômputo geral. A extinção de freguesias onde já não há escolas, nem padres, nem serviços de saúde, nem finanças, nem tribunais, em regiões onde elas já são a única presença do estado soberano, acentua ainda mais o doloroso abandono. E a ausência quase total de discussão pública democrática, em ordem a encontrar as melhores soluções, apenas induzirá tensões e conflitos e vesânias, sem qualquer benfeitoria.
A hidra dos autarcas visionários, que o Relvas superintende, prosseguirá o percurso dos seus negócios e da nossa decadência, se não for antes o da nossa ruína e da nossa miséria. E os culpados somos nós, porque comemos demais, como eles dizem. Porém, custe o que custar, Portugal há-de voltar a ser o que foi sempre, desde há 500 anos. Uma pátria de enjeitados, governada por traidores.
NOTA: As citações são do jornal "O Interior".

São muitos os vigaristas...

... mas o modelo é o mesmo.

Olhar em volta

Homens sérios e canalhas.

Ecos 13***

No dia em que entrou na expo 98 pela primeira vez, o aníbal caracol ficou tão aturdido que nunca mais de lá saiu. Vivia ali perto há quarenta e oito anos, numa ruela de moscavide, entre paredes greladas de humidade. E para ele a doca dos olivais era apenas uma cloaca a cheirar a enxofre e a lamas de petróleo, onde lavavam os pés os bandos de gaivotas, que chegavam em nuvens dos lixos de beirolas.
Durante anos vira andar por ali milhares de pretos a fugir à frente de esquadrões de catrapilos, que removiam as terras onde iam enterrando o melhor do orçamento da nação. E quando chegou um dia ao largo o clarão dos foguetes das inaugurações, logo uma antiga intuição lhe disse que não era de esperar grande coisa daqueles senhoritos de mão fina, que gastavam os dinheiros do país e se pavoneavam nas televisões. Mas passou um tempo e ele acedeu a dar uma vista de olhos, sem lhe passar pela cabeça a reviravolta que a vida ia levar.
Logo à entrada se deixou agradar da grande luz daquilo tudo, parecia-lhe esta uma aldeia como todas deviam ser, aberta à claridade azul do rio, onde o céu largo se espelhava. Havia nas construções uma harmonia que não sabia explicar, uma graça nas formas das coisas que o tocava por dentro e o deixou pensativo, à medida que foi andando por ali, até as pernas lhe dizerem que não. Nas ruas e nas encruzilhadas não havia buracos nem charcos, qualquer um podia andar ali de olhos fechados. A gente era mais que muita, de cara feliz por aquelas alamedas, e não se ouviam ruídos frenéticos, não se viam lixos no chão, nem garrafas vazias a rolar pelos cantos.
Havia multidões por todo o lado e ninguém se atropelava, ninguém escarrava no chão, ninguém destruía os bancos dos jardins, ninguém ultrapassava ninguém nas filas de espera, e quase se podia jurar que toda aquela gente pagava os impostos com orgulho. Respirava-se ali uma civilização, qualquer um o podia sentir, e o aníbal caracol ficou tão assombrado que já não sabia em que país se achava.
Nesse primeiro dia a noite chegou depressa e o aníbal caracol não regressou a casa. O corpo doía-lhe tanto que se acomodou no recanto dum edifício qualquer. Passou a noite em grande agitação, sem saber muito bem que terra e que gente era esta que o cercava. Sonhou que alguém tinha alargado as fronteiras da exposição, e que, por milagre, a vida era assim em todos os lugares. Mas, quando acordou e se achou desenganado, tomou a decisão de nunca mais voltar ao país cabisbaixo, incivil e caótico, que sempre conhecera. Passou a viver num esconso da realidade virtual.
O mais duro foi quando a expo 98 chegou ao fim. Mas o aníbal caracol conhecia as tradições da pátria, sabia muito bem o que em casa se gasta, e já tinha pronta uma saída. Ao fechar dos portões de encerramento, enquanto os guardas pastoreavam os últimos recalcitrantes até ao palmeiral da entrada, lançou-se em abordagem fulminante à lorcha de macau e zarpou à descoberta do quinto império.
Não teve sequer tempo para enfunar a cruz de cristo. Um couraçado da marinha meteu-o a pique no mar da palha, interrompendo ali o que estava para ser um novo mergulho nos abismos cavilosos da epopeia. Eu achei bem. Depois do que foi a primeira, não é certo acharem-se outra vez os poucos heróis e os múltiplos vilões que uma segunda havia de exigir. E duvido ainda mais de que valesse a pena achá-los. Por mim, confesso já que voltaria a desertar da guerra da guiné, daqui por quinhentos anos.
[***Eco de 2002]

sexta-feira, 17 de agosto de 2012

Instantâneos 6

América ensaia avião Mac 6. De facto, a seis vezes a velocidade do som é outra loiça.

Encore26

Maria Teresa de Noronha - Minhas penas

Trocar a TAP por um prato de lentilhas

Contribuição solidária dos lordes para o patriótico objectivo dos relvas!

Ecos 12***

Era uma vez uma família muito pobre. Vivia numa aldeia em que as noites eram escuras, e mais longas ainda quando a fome se punha a cantar nas barrigas, antes de chegar a manhã.
Certa noite, num serão de pão escasso, lembrou-se o pai de contar uma história. E vai ele, que bom seria, mulher, termos dinheiro para comprar uma cabra. Havíamos de levá-la à vez a pastar pelos caminhos, para ela encher a barriga de botões das silvas bravas, quando o sol, na primavera, constrói jardins nas paredes. E quando a noite chegasse, e a cabra voltasse a casa, íamos colher-lhe o leite, e as noites seriam longas, e a família cresceria, já viste mais alegria. Mas eu não gosto de leite, tornou o filho mais novo. E quando o outono chegar, e as silvas ficarem duras, subo ao freixo do valado, e do mais dourado ramo se há-de fartar nosso gado, disse o outro, confiado. Mas eu não gosto de leite, insistiu o desgraçado.
Numa breve conclusão, perde o pai o seu vagar, e ali mesmo obriga o revel e obstinado filho a engolir duas grandes tigelas de leite na companhia dos irmãos, que assim dormiram toda a santa noite, de barriguinha calada.
É claro que tudo isto aconteceu num tempo muito antigo, enquanto havia milagres e cabras que davam leite.
[***Eco de 2002]

quarta-feira, 15 de agosto de 2012

Queres saber?!

Está aqui bem explicadinho o que o melro disse no comício.
E ali está o que o espantalho quis dizer.

segunda-feira, 13 de agosto de 2012

Lendo atentamente

Só tens a ganhar!

Era uma vez

Era uma vez um asno que um dono tinha. Não é que fosse um burro de Apuleio, mas o asno era feliz. Foi à escola e aprendeu uns rudimentos, lia e escrevia histórias da carochinha. É certo que tinha falhas, mas não se pode ter tudo. E o asno acabou mesmo a escrever num jornal.
Mas tinha um senão infausto. Era a palha que o seu dono lhe servia, e lhe deixava um fastio.
Um dia o asno entrou numa loja de chinês e comprou uns óculos verdes, que faziam autênticos milagres. Transformavam a palha costumeira na erva fresca dum prado. Ficou tão contente o asno, passou a viver nas nuvens. Pelo menos era daí que lhe chegavam as crónicas!

Na falta de um link, transcreve-se esta amostra irrecusável. A contra-gosto, mas com muito respeitinho.

"Meu caro Passos Coelho, continuo a ter consideração por V.Exa. Aceitar governar Portugal no pós-Sócrates foi mais ou menos como aceitar treinar o Benfica no pós-Artur Jorge. E para mal dos pecados dos seus inimigos internos e externos, este respeito aumenta quando percebemos que a sua governação começa a dar resultados. (...)
O que é espantoso é que V.Exa não consegue colocar este e outros sucessos na agenda. Eu sei que há uma má-vontade epidérmica dos jornalistas ante um governo direitolas, mas isso não explica tudo. V.Exa e o seu partido têm o problema contrário do PS e do seu antecessor: sabem para onde vão, mas não têm jeito para o discurso político. (...)
Sugiro-lhe, portanto, uma mudança de estilo para o segundo ano do governo com mais coragem em várias décadas: fale menos, e quando falar explique as coisas em português e não no latim dos economistas.(...)
Boa parte das pessoas ainda não percebeu a crise e a consequente terapia, porque V.Exa parece um daqueles padres antigos a fazer homilias em latim."

Febres e guerras

É menos malsã que outras, mas a que deu finalmente aos municípios portugueses foi a febre das capitais. Cada um é capital da coisa mais original, havendo mesmo a improvável do mirtilo. Já a Penedono, um simples relance basta para lhe chamar a capital da pedra.
Um tal brasão tem outras guarnições, nestes tempos estivais ufanamente expostas ao ar livre. E não havendo legenda explicativa, resta aos passantes a imaginação.
Nos tempos do Magriço, cuja figura por aqui se reivindica, nestas alfaias feras guardava-se a mioleira e os parietais do inimigo.    


Já esta era a poltrona reservada aos incréus, enquanto se não dispunham a aceitar a  verdade.

Nesta polé faziam-se massagens, alongamentos e carne picada, a pedido do freguês. 

Em caso de guerra, não se limpavam as armas. E a esta chamavam-lhe, quem sabe, a super-besta. Disparava virotões perfurantes.
A catapulta comum.

Um aríete blindado.
A catapulta-funda, que ainda hoje inspira os palestinos.

O espringal, é a legenda que o diz, disparava virotões certeiros.

E a bastida, que permitia invadir a mais dura muralha.
O que os homens inventaram, nas guerras de antigamente!
Tudo isso nos coloca Penedono à frente dos olhos espantados.
É certo que nos não mostra como é que se ganham as guerras de agora! Mas sugere-nos, em ar de brincadeira, como se pode perdê-las.

sábado, 11 de agosto de 2012

sexta-feira, 10 de agosto de 2012

Ecos 11***

Copiando descaradamente as velhas tácticas da operação nó cego, que a seu tempo reduziram a pó o planalto dos macondes, desencadeei uma série de campanhas que me permitiram ultrapassar a crise dos pulgões amotinados. Porém, logo após a euforia da vitória, dei conta do estado lastimoso em que me ficara o terraço, quem tenha andado nas trincheiras da flandres saberá do que estou a falar.
Ora este era o pequeno património que me restava da família, e guardava para mim um vasto significado emotivo, a despeito de algum desvalor intrínseco. Pedi o parecer dum paisagista, que em boa hora me aconselhou a reconversão agrícola do espaço. Sem ajuizar, por certo, das metamorfoses a que me ia sujeitar.
Havia que fazer opções. E não sei se foi a antiga preocupação de dar de comer a um milhão de portugueses, ou se foi a minha costela pagã a lembrar-me que nem só os deuses merecem um bom vinho. O facto é que não demorei a plantar uns bacelos que arranjei no mercado, após o que tratei de me associar a uma destas agremiações da lavoura de qualidade, que há muito me habituara a reverenciar.
Logo na primavera, estavam os bacelos a abrolhar os primeiros gomos, começaram a sair-me coelhos da cartola. Havia um qualquer instituto no ministério da agricultura, que pagava generosamente o arranque das cepas. E eu, moderno empreendedor, tinha que ser pragmático. Meti os catrapilos a arrotear o terraço, e ainda me sobrou capital para investir num parque de máquinas. Comecei logo por um jipe samurai de tracção integral, e passei a deslocar-me ao centro da cidade em viatura própria, liberto das indigestões da carris.
Eu era agora um empreendedor, como já ficou dito, e tinha o terraço devoluto. Frequentava os seminários da grape, à procura de entender, entre o tinto e o patanegra alentejanos, os meandros daquilo que toda a gente chamava a política agrária global. Por alguns anos, e enquanto, salvo seja, ia apalpando o terreno, apostei na cultura das oleaginosas, que funcionava de modo tão simples quanto surpreendente. Eu lançava as sementes à terra, e garantia logo a correspondente subvenção. Porém, sendo os gastos da colheita superiores ao valor do produto, o destino da plantação era mirrar-se lentamente, até se desfazer ao vento. Ficava eu livre de trabalhos vãos, enquanto o fundo de garantia se encarregava de manter-me em equilíbrio os orçamentos.
Esta espécie de pousio havia de ter como efeito uma notável melhoria dos solos, a tal ponto que me abalancei à cultura de frutas mais especiosas. Apresentei um projecto de plantação, cuja subvenção a fundo perdido incluía um sistema de rega científico, inventado por judeus do deserto. E embora mais adequadas às neblinas da nova zelândia, as plantas resistiram à escassez de águas e mostravam considerável vigor.
Passados três anos, a primeira produção foi tão fecunda que o mercado recusou absorvê-la por inteiro. A situação era de vera catástrofe, não havia estações de armazenamento para acolher tanta fruta, esgotou-se a capacidade nacional de produção de embalagens. Apoiado pela grape, exigi a intervenção do governo. E a resistência obstinada do ministro, a quem alguns jornais chegaram a imputar infames antipatriotismos, acabou por ser-lhe fatal às coronárias e à carreira política.
Mas não há fartura que em fome não venha a dar, conforme o outro diz. Logo no ano seguinte, chegou em maio uma tardia onda de geadas negras, e as belas promessas dos pomares foram-se murchando e acabaram mirradas. Reclamei do governo a declaração de calamidade, e consegui apoios de emergência que me pouparam à falência.
Mas ficara-me da fruta um sabor desconsolado, depois de ver como a geada perturbara o estado vegetativo dos pomares. Ainda fiz umas podas extraordinárias, umas empas de recurso, ainda apliquei umas caldas de aquecimento mas nada valeu a pena. E eu era agora um empreendedor, volto a dizê-lo propositadamente, tinha que fazer opções sustentadas de investimento.
Foi assim que me entreguei à produção de leite. Apresentei os planos num instituto do ministério, e logo vieram uns catrapilos a instalar a pastagem, quando nos estábulos se afinavam já os equipamentos de automatização. Chegaram por fim umas dúzias de vacas frísias, que eram um consolo para a vista.
Foram dois anos que me deixaram saudades. Isto antes de os tipos de bruxelas reduzirem drasticamente o subsídio à produção, e antes de os galegos terem entrado no mercado, parecia a dada altura que o rio minho se fizera leite.
Foi por então que tive que vender a casa de férias no algarve, antes de entregar um projecto de reconversão à produção de carne, que me evitou males maiores. Em boa hora se foram as frísias e vieram as charolesas. Havia no ministério um fundo de apoio por cabeça, e os técnicos agrícolas vinham controlar os efectivos, volta não volta. Eu recebia-os pela manhã, na adega, com tinto e patanegra da amareleja, e a tarde passavam-na no terraço, embrenhados em observações de campo. Dava uma trabalheira transferir nessas noites o efectivo para a marquise, onde eu tinha montado um cenário de pastagens alpinas, a vistoriar no dia seguinte. Mas as contagens finais resultavam generosas, e foi graças a elas que a exploração floresceu.
Um dia fui ajeitar o penso às charolesas, e dei com elas a dançar a polca, cheias de cortesias. O veterinário fez-me o diagnóstico à mesa do café, as vacas tinham enlouquecido. Estalara a moda na inglaterra, quando os cientistas quiseram obrigá-las a comer os antepassados.
Caiu-me o queixo de estupefacção, e fiquei dois minutos a benzer-me. Mas o homem adiantou logo que estava criado um fundo para abate. E eu aproveitei-me dele para trocar o todo-o-terreno e abandonar o ciclo produtivo.
Por uns tempos ainda estive tentado a reconverter-me à floresta, usando um fundo de modernização. Mas tenho-me limitado a ver arder as matas dos vizinhos.
***[Eco de 2002]

Encore25

Maria Teresa de Noronha - Fado Anadia

Emboscada

Tiago Patrício nasceu no Funchal em 1979, mas viveu em Carviçais até aos 19 anos. O rapaz tem prémios na poesia, escreve para o teatro, e coisa e tal. Há dias encontrei o seu romance Trás-os-Montes num escaparate e caí na emboscada. O que é que eu hei-de fazer deste meu apego aos campos e à vastidão das paisagens, à silhueta das serras no horizonte, à promessa bucólica dum renque de salgueiros na margem dum riozito?!
O livrinho era edição da Gradiva, e ganhara, em 2011, o Prémio Revelação Agustina, instituído pela Estoril-Sol. O júri que o seleccionou fora presidido pelo senhor Graça Moura, à frente de Oliveira Martins pelo Centro Nacional de Cultura, de José Manuel Mendes pela Associação Portuguesa de Escritores, de Maria Gil Loureiro pela Direcção Geral do Livro e das Bibliotecas, de Manuel Frias Martins pela Associação Portuguesa de Críticos Literários, de Maria Alzira Seixo e Liberto Cruz a título individual, e de Nuno Lima de Carvalho e Dinis de Abreu pelos patrocinadores. Com as sugestões do título, a eminência da madrinha e a sombra destas figuras no terreiro literário, tudo eram favas contadas. Só um milagre me podia ali salvar.
Ressalvado o respeito pela gramática, o discurso narrativo não se afasta do grau zero. A estética da linguagem é a mesma dum programa de tradução automática. Umas tantas crianças evoluem e crescem num espaço rural, que não ganha especificidade própria. É numa aldeia de Trás-os-Montes como pode ser num qualquer acampamento de ciganos. O fio narrativo é uma colagem de quadros, damo-nos conta do crescimento interior das personagens à medida que evolui a natureza e o teor das peripécias. A ruralidade é falsa, a irrealidade é persistente, e raramente se ajustam o discurso, os conteúdos e as figuras. O todo é um desacerto, uma ausência de substância.
O autor dá a sua contribuição para esta espécie de loucura mansa em que todos vivemos, fugindo à realidade. Porém a maior dela vem dos sacerdotes ali acima descritos. Nenhum dos membros do júri leu duas páginas disto, e fizeram muito bem porque pouparam o tempo e a paciência. Mas emprestaram-lhe o nome e amamentaram um sistema alienado.
Salva-se aqui a lógica do editor, que aproveitou a deixa e fez negócio.

"(...) O Miúdo começou a cuspir e a arrancar as bostas que havia à volta dele e a atirar com elas aos outros que ainda estavam a tentar negociar aquele almanaque de raparigas despidas. Edgar aproveitou a oportunidade e acertou com uma bosta directamente na cara de Oscar e ele respondeu-lhe com insultos e pontapés falhados, porque se recusava a participar e a sujar as mãos na porcaria, mas ficou com a roupa e o cabelo encaracolado tão sujos que acabou por participar naquilo que se tornou num jogo com as regras semelhantes às do futebol humano. E como se tornou belo esse acto clandestino, naquela noite cheia, de lua esboroada entre os montes, numa semi-obscuridade, onde as bostas os atingiam na cara ou nas costas e se desfaziam em pedaços por dentro da roupa.
A Lua subia contrariada e ganhava uma cor branca, os grilos faziam-se ouvir com mais intensidade, um dos homens que fumava atirou com uma beata para o chão, uma das mulheres assomou à porta e abriu as pernas para urinar e um ribeiro escorreu pela valeta. Outra mulher queimou-se no fogão enquanto fervia água e veio até à rua gritar palavrões para os homens sentados em silêncio. Um mocho pousado numa árvore próxima piou e duas pinhas tombaram sobre o telhado da casa de pedra rente ao chão. Um dos homens mais novos foi ter com os cães encostados à cerca e começou a provocá-los até eles começarem a lutar, depois continuou a dar-lhes pontapés para que eles não parassem. Entretanto procurou uma pedra na base do muro e levantou-a. Tirou lá de baixo uma folhas enroladas e abriu-as várias vezes até encontrar o que procurava, depois pousou-as em cima do muro e, quando parecia que ia urinar, começou a fazer movimentos lentos e depois cada vez mais rápidos até que se vergou sobre o muro, apoiado na mão esquerda,enquanto a direita terminava o assunto. Esperou alguns instantes, até que se ouviu um fio de urina escorrer sobre as pedras. Abotoou-se e acendeu um cigarro depois de voltar a guardar a revista debaixo da mesma pedra."

quinta-feira, 9 de agosto de 2012

É bom

Ver como este mundo é, sem ter que lá irAqui, ali e acolá.

A alma e o discurso

Forçosamente vê-se privado de alma, um homem sem discurso que a exprima. E vice-versa, pelo discurso se pode avaliar a dimensão que ele alcança.
Alheio a quadraturas partidárias, sou dos que pensam que a direcção actual do PS, e que o PS elegeu, é o pior que nos podia ter acontecido. É uma direcção de burocratas redondos e rotineiros, de carreiristas encaixados, de mansos consensuais, de gente do aparelho incapaz duma faísca e duma ideia. Exactamente por isso é que o aparelho a elegeu, para sua própria bonança. Mas os nossos tempos são de tempestade.
Vem isto, bem ou mal, a propósito dumas frases de Francisco Assis, que transcrevo do PÚBLICO:

"(...) Há poucos sítios como Vila do Conde e não há, certamente, nenhum lugar como as Caxinas. (...) Lembro-me do grande acontecimento ao anoitecer - pesadas malas de latão agarradas pelas mãos de pescadores que partiam. Percorriam as ruas com uma gravidade de personagens de film noir, iam ao encontro do mar e finalmente embarcavam. As mulheres ficavam, como se numa terra destas fosse possível ficar. 
São seres trágicos, as mulheres das Caxinas, vogando entre a aritmética da economia doméstica e a devoção mística ao Senhor dos Navegantes. O vento norte percorre-lhes eternamente os cabelos, os olhos exibem uma autoridade matriarcal que nunca se desvanece, nem sequer nas horas de angústia quando "mar chão" dá lugar ao "mar cão". Os homens partem para o mar, para a imponderabilidade, o que os revela frágeis e até um pouco infantis. Elas ficam. E ficar significa tudo - a casa, os filhos, a subsistência, a ilusão de um futuro. Elas não ignoram a pior das sentenças - sabem que sobreviverão à tragédia. É esse o seu destino. (...)

A síndrome do caniche

Isto é uma coisa inacreditável!
Ou este cabrão já deu conta de que o país precisava dum primeiro-ministro a sério, ou padece da síndrome do caniche, que passa a vida   a meter o nariz nos entre-folhos da dona.

O Al Capone era um menino de coro

As autoridades judiciais da América prometem isentar ex-funcionários da União de Bancos Suíços de acusações criminais, caso aceitem colaborar nas investigações em curso, as quais analisam a manipulação da Taxa Libor, utilizada nas transacções bancárias em todo o mundo.
Tentam identificar os principais responsáveis pela tramóia, em que está envolvida a nata dos bancos europeus e americanos, o DB, o City Bank, o HSBC, o Braclays, a UBS, o Crédit Suisse... Muito por baixo, 16 marmelos! Uns que na América nos fizeram a cama, e outros que por cá nos compõem a almofada.
Faz-me lembrar o fisco do Gaspar, que também oferece amnistias a criminosos relapsos, em troca duma bula de 7,5%. Mas aqui há uma agravante. Na América isentam-se os serviçais do crime, o Gaspar amnistia os seus autores.
Se o Al Capone ainda por aí andasse, tinha muito que aprender.

Robert Hughes morreu

Não tenho um link do PÚBLICO de hoje. Transcrevo a meu critério.

"As palavras ganham mais peso porque são de um colega. Era simplesmente o melhor crítico de arte do nosso tempo. Foi assim que Jonathan Jones, crítico do diário britânico The Guardian, começou o texto sobre Robert Hughes (...). 
Sobretudo nas páginas da revista TIME, já que este australiano passou boa parte da vida nos EUA, Hughes fazia com que a crítica parecesse literatura, acrescentou Jones, para quem a sua rudeza inconfundível podia ser libertadora. 
Ele comparou a arte do início do séc. XX com a de hoje, e chegou à conclusão de que mesmo os melhores não merecem ser equiparados aos pioneiros do modernismo. Isto é uma verdade difícil de refutar. As palavras de Robert Hughes custaram-me muitas horas de sono.
Brilhante e combativo, Hughes tinha uma forma única de comunicar a arte e os artistas. A série documental que fez para a televisão, sobre a história do modernismo, dos impressionistas a Andy Wahrol, The Shock of the New, foi vista por 25 milhões de pessoas e depois transformada num dos seus bestsellers (...). 
Feroz crítico dos que transformaram a arte em negócio, com nomes como Wahrol, Jeff Koons, Joseph Beuys e Damien Hirst à cabeça, era generoso nos elogios quando se tratava dos génios modernistas, de Freud ou de Goya. Para Hughes, a arte contemporânea transformara-se simplesmente no brinquedo do mercado. (...)".

Para que não vás dizer como o Berardo. Que ninguém o avisou a tempo e o deixaram sozinho a olhar p'ró balão, cercado de comissários.

quarta-feira, 8 de agosto de 2012

Encore24

João Ferreira Rosa - Fragata
Lá estamos nós, outra vez, a esbracejar sobre o nada!

Instantâneos 5

Tem quinze anos e chega dos Açores, este juvenilíssimo autor. Ainda não foi descoberto pela Maria do Rosário Pedreira, a olheira mais cotada de escreventes premiados. Mas já editou duas obras, a primeira aos dez anitos.
Cita Pessoa, dizendo não sei o quê. E já foi recebido pelo Crato, que lhe não regateou incentivos morais.
Quando for grande, quer ser primeiro-ministro. E de facto a televisão confirma que ele trata o papel e a caneta por tu. Nem todos, bem mais velhos, o conseguem!

Meças

De forma que o Mário Crespo, essa mesma figura inenarrável, juntou a Zita Seabra, o Putin, o Motim das Pachachas e uma espada de Dâmocles, numa catedral do Kremlin. Para nos desvendar o mundo e ajudar-nos a entendê-lo.
Lá como cá, pedem meças uns aos outros.

Longa vida à blogosfera!

Por isto, por aquilo, e por aqueloutro.

Romaria

O Avante! já foi uma bandeira. Honra e glória a todos os que sofreram, e morreram, pela nossa dignidade colectiva.
Não fui à FIL, que estava muito longe. Vi o Jamor, que incomodou muita gente. Andei na Ajuda, o anfiteatro mais belo de Lisboa, quando foi preciso limpá-lo de calhaus. A Loures nunca fui. E visitei uma vez a quinta da Atalaia.
Já houve em tempos uma Festa do Avante. Hoje é uma romaria de idólatras pasmados, presos no erro e na superstição. Festa de vida e de esperança e de futuro é que não é. Para nossa desgraça colectiva, há que dizê-lo.

Citação

"Um sistema político [clientelar, feudal e partidocrata] que é pior que a sociedade que representa, não se mudará sozinho".

[Rui Tavares, hoje no PÚBLICO]

Epicuro

Se um dia, ao olhar o espelho, lá encontrares Epicuro, agarra o fugaz instante. És feliz, e das três uma.
Ou tens atrás de ti um longo sofrimento, ou um vago deus perdulário, ou o destino caprichoso à tua espera na esquina.

Faros velhos

Quando posso volto aqui. Aos eflúvios que ainda exalam dos mostos de há dois mil anos.

Bravos

Do picadeiro de Leça ao areal do Lavra são duas horas puxadas, pelo passadiço de pau. As casas bordejam o cordão dunar, às vezes assustam-se com os dentes dos leixões e recuam um pouco. O povo estendeu no areal os toldos coloridos e abandonou-se ao sol, por trás do tapa-vento da nortada. 
Os milharais de ensilagem disputam a várzea a vivendas patuscas, a mansões V5 em banda que estão à venda com Audi à porta. O resultado é uma paisagem crioula e arraçada, um logradouro que ninguém sabe o que é.
A meio da caminhada fica o padrão do Mindelo, onde uns bravos um dia deram à costa. Em tempos era aqui o Pampelido, já foi um varadouro de piratas, agora chamam-lhe a Praia da Memória. Mas não se lembram de nada.

O inimputável

O Relvas chegou ao topo dos sonhos juvenis: atingiu o estatuto do inimputável, que já ninguém leva a sério. Ficou para ali, porque ninguém lhe deu baixa e o mandou para a reciclagem. 
Uma distracção assim é tudo quanto lhe basta para fazer o que quiser, impunemente. E ele lá o vai fazendo, reciclando-nos a todos. Quem folga são os seus patrões.

terça-feira, 7 de agosto de 2012

Bonecos pintados

A última vez que o vi, era Portugal assim. Depois só ficaram bonecos pintados.

segunda-feira, 6 de agosto de 2012

Instantâneos 4

Às 08H15 de 6 de Agosto de 1945, o mundo viu o primeiro cogumelo nuclear crescer sobre uma cidade.
A ordem veio de Harry Truman, presidente da América.
E o argumento do fim da guerra, apresentado como pretexto, era falso, insuficiente e desproporcionado. O Japão já preparava a inevitável rendição.
A demonstração da hecatombe era endereçada a Moscovo.
As 140 mil vítimas imediatas, e um tal ensaio de barbaridade, foram um repetido crime contra a humanidade, que ainda mais ninguém ousou.
E de que já ninguém fala, nesta zona de silêncio em que o mundo caiu.

Instantâneos 3

No Wonderland há um fortíssimo lobby das armas, segundo o qual o adorno duma Kalashnikov em bandoleira é um direito primordial do cidadão.
Há 15 dias atrás, em legítimo usufruto desse direito fundamental, um cristão foi ao cinema e liquidou logo ali uma dúzia de basbaques que mastigavam pipocas.
Ontem foi um patriota que entrou numa igreja exótica e logo tirou o pio a sete penitentes de turbante.
Em escolas, tem sido um corrupio, com grande gáudio dos industriais das armas. E a mesma unção inunda o Vaticano, cujo Banco Ambrosiano - o Instituto para as Obras da Religião - é primeiro accionista da italiana Pietro Beretta.

Instantâneos 2

O sistema prisional americano é privado, e isso é uma coisa muito boa. Justifica e amplia os direitos dum poderoso lobby, que advoga bravamente o endurecimento das penas judiciais.
Pois porquê?! Porque assim aumenta a população prisional, e o lucro que dela sai.

Não percas!

Vai aqui!

Mídia, media, mérdia

Diz o PÚBLICO, em Caras da Semana:


Kofi Annan - O derrotado
O antigo secretário-geral das Nações Unidas atirou a toalha ao chão e desistiu da tentativa de conciliar as partes em confronto na Síria. Apesar das muitas críticas de que foi alvo, não tem que se queixar de si próprio, mas sim de Moscovo, que se arrisca a pagar bem caro a sua inflexibilidade neste dossier. É que a guerra na Síria evoluiu para um cenário de instabilidade total, onde a possibilidade de controlar o cenário pós-Assad é cada vez mais remota. Annan sabia que as suas hipóteses de sucesso eram quase nulas. Pode ser criticado por ter demorado demasiado tempo a demitir-se, mas não por não ter feito tudo o que podia.


Mas o que é que se passa dentro deste vórtice de auto-destruição em que a Síria parece ter entrado há mais de um ano?! O país não tem petróleo significativo, que possa justificar os crimes de guerra praticados por Londres, e Paris, e a Nato ao serviço da América, que bombardeou a Líbia e precisava de destruir Kadhafi, tal como já tinha destruído Sadam Hussein. 
O pretexto, sempre falso, foi proteger os pobres líbios dum tirano, a quem se opunham uns rebeldes amantes da liberdade primaveril. E foi livrar-nos a todos das armas de destruição maciça que o Sadam tinha escondidas no deserto, e afinal não existiam. 
O resultado são dois países em ruínas, onde as empresas multinacionais ocidentais se instalarão para fazer bons negócios. A vida das respectivas sociedades recuou 50 anos, e o poder resvala inexoravelmente para as mãos de seitas de fanáticos teocráticos, que se regem pela sharia e o Corão. É o que se vai passando no Egipto, mas isso só chegará um dia!
Na lembrança anda ainda a história do Kosovo, esse país de marginais e traficantes que a Nato edificou, e onde a América possui a maior base militar da Europa, de que nunca ninguém fala.
Mas já chegámos à Síria, um país tradicionalmente secular dirigido com mão dura, e queremos entender o que se passa.
Sabemos, ou intuímos, que a Síria é peça central no controlo da bacia petrolífera que rodeia o Golfo Pérsico, onde convergem interesses concorrentes. Dum lado o eterno problema de Israel e da Palestina, e os interesses energéticos do Ocidente (europeu e americano); doutro lado o Irão, a China e a Rússia. 
Nós intuímos apenas que o Médio Oriente é o cenário mais quente do planeta, em termos geo-estratégicos e militares. Ouvimos falar dum exército de rebeldes que se opõem a Assad, e combatem a sua tirania. E lembramo-nos de que já ouvimos esta história.
Soubemos há uma semana, pela CNN, que Obama afinal há muito tempo autorizou a CIA a envolver-se na Síria e apoiar os rebeldes. Dinheiro, armas, apoio, aconselhamento, informação?
Sabemos que a ONU está paralisada por interesses inconciliáveis. Sabemos que Annan se demitiu da função emissário.
Neste imbroglio, o que é que os media nos dizem, para nos ajudar a pensar?!
Que há uma guerra civil na Síria, que os pobres sírios estão a ser dizimados por um monstro, e que o país está a ser aniquilado porque um tirano não cede. Que há duas partes em confronto inconciliável dentro da Síria, de igual legitimidade. Que só existe impasse porque há inflexibilidade de Moscovo, deixando na sombra a inflexibilidade da China, que também não anda a dormir.
Estes media são uma mérdia, que em vez de informarem cidadãos apenas nos transformam em carneiros.
Não nos dizem que a primeira obrigação de qualquer dirigente de qualquer país é resistir, com todas as armas, ao aniquilamento da sua terra por forças externas predadoras. Pois é isso que está a acontecer, mais uma vez, na Síria.

domingo, 5 de agosto de 2012

Nota biográfica

O autor nasceu na Beira Alta, em 1943. Fez a escola primária numa sala duma casa duma aldeia, onde viviam também um crucifixo e um mapa, uma ardósia, um Salazar e um Carmona. E o fantasma dum Navegador que metia medo à aula.
A mesquinha propina no seminário do Fundão permitiu ao autor escapar à condição de servo da gleba, num trato em que perdeu um amigo e ganhou outro. O que perdeu foi um cavalo baio, que um doutor qualquer tinha na estrebaria e andava precisado dum palafreneiro. O que ganhou foi o Cícero das Catilinárias.
Passados três anos já Deus Nosso Senhor o despedia, pela voz do cónego vice-reitor. Porque na vida é assim, muitos serão os chamados mas poucos são escolhidos. E o autor aproveitou, em vez de emigrar para França, para acabar o ensino secundário no Liceu Nacional da Guarda, em 1963.
Foi piloto militar durante muito tempo, em Angola salvou o pêlo à justinha, na Guiné acompanhou a agonia demente do império. E a derrocada dele trouxe ao autor enormes benefícios, isto porque Deus não dorme e faz boas escolhas, e sabe escrever direito em linhas tortas.
Das múltiplas peripécias de 1975 havia de resultar o afastamento do autor das lides profissionais, num processo que o levou à demissão, acusado de deserção por um Torquemada qualquer. Foi assim que o autor se licenciou em Letras, fez um mestrado em Cultura Alemã na Uninova, e passou anos a dar aulas apaixonadas.
Mas tudo se recompôs vinte e tal anos mais tarde, por decisão dum juiz que acordou bem disposto e pôs tudo em pratos limpos. O autor voltou ao seu lugar no quadro dos pilotos aviadores, e ficou a saber o que é um coronel de aviário.
Desse tempo há textos seus em várias antologias da guerra colonial, quando ainda lhe não era muito clara a linha de fronteira entre um escritor e um escrevente. Em 2002 publicou O Mensário do Corvo. E ganhou com ele aguda percepção de que os embondeiros fazem mais falta nas paisagens do mundo do que nos escaparates duma livraria, transformados em papel inútil.
Em 2007 publicou As Aves Levantam contra o Vento. E, graças a mão amiga, ganhou a consciência de que escreve. Depois disso assumiu a liberdade e o risco de continuar a escrever. De consciência tranquila, enquanto Deus Nosso Senhor quiser.

Mais clarinho...

... não há!

Banha da cobra

A uns propagandistas bem remunerados, e outros publicistas avençados que andam aí a embandeirar em arco - que finalmente Portugal voltou a ter um saldo comercial positivo desde 1943 -  é preciso lembrar o seguinte. As contas desta nação só conheceram, ao longo da história, um sossego muito relativo, quando três quartos dos portugueses vegetaram na penúria e mourejaram de sol a sol, para que o quarto restante, da elite e adjacências, vivesse à tripa forra. 
Tudo o que sai deste quadro é foguetório conjuntural, que os deixa ficar muito mal no retrato.
Na realidade:
- Nos anos da 2ª Guerra, as exportações de volfrâmio e conservas de peixe perfaziam 40% do total exportado. E alguém descreveu nessa altura o país como "o deprimente espectáculo dum homem com os bolsos cheios e o estômago vazio".
- Para poupar os delicados olhos dos refugiados europeus à visão da miséria dos portugueses, Salazar mandou "reenviar os pedintes para o meio rural, internar os desviantes na Mitra, proibir andar descalço e mendigar".
- A saúde pública era um quadro assustador: morriam 40 em cada mil bebés, no primeiro mês de vida; em 1941, morreram 150 em cada mil, antes de atingir um ano de idade; a subnutrição e a miséria vitimavam os próprios adultos, reduzindo a idade média de vida para valores inacreditáveis.
- O próprio ministro do Comércio e Indústria em 1940, Dias Júnior, reconhecia em livro que "o salário médio do operário português não chegava para satisfazer três quartos das necessidades alimentares da sua família".
- No campo, a situação vergonhosa só mudava de cenário: em 1944, "a alimentação consumia mais de 80% dos gastos das camadas mais pobres"; e "os jornaleiros do Sul, sem trabalho certo, gastavam 70% dos salários de todos os membros da família com a alimentação, consumindo mesmo assim apenas 36% das gorduras indispensáveis".
Vem isto a propósito de quê?! Pois de nada! Porque um Salazar a seu modo fascista e colaboracionista, serventuário das elites, sobreviveu à derrota nazi. E logo esclareceu que, "se era indiscutível ter o totalitarismo morrido por efeito da vitória, já a democracia, tanto na sua definição doutrinária como nas suas modalidades de aplicação, continua sujeita a discussões. E bem!".***
Tudo isto só começou a mudar em Portugal com o 25 de Abril e os governos do Vasco Gonçalves. Tudo o mais são gargalhadas da mesma hiena que hoje ri de novo, enquanto nos faz a cama. E a quem um comité central, cego, estalinista e paranóico, ajudou a abrir as portas do poder. 
[*** Dados do PÚBLICO]

Instantâneos 1

- Crazy!!! Are we going to war?!
E logo um grande silêncio, uma longa estupefacção, um inconfessado medo.

Encore23

Mª Teresa de Noronha - Fado das horas

sábado, 4 de agosto de 2012

A mafia vista por dentro

Na nossa vida colectiva, há duas coisas que ninguém desconhece. A primeira é que a corporação da Justiça é há séculos uma das mais poderosas e opressivas. A segunda é que, pela sua ineficácia e falência, é hoje das maiores vergonhas nacionais, com estilhaços económicos mortíferos.
A questão tornou-se ainda mais intrincada, quando surgiram estruturas sindicais ilegais e oportunistas, enquistadas nos órgãos da soberania. A mesma lógica diria que tem lugar e faz falta o sindicato dos deputados à Assembleia da República.
Lembro-me bem da corrosiva acção, e da figura, do Palma e do Martins, aqui há uns tempos atrás. Daquilo que promoveram nem vale a pena falar. Mas aqui se vê melhor a teia que aquilo é.

Biblioteca pessoal

Há-de haver quarenta anos passei uns tempos numa base aérea que os americanos utilizam no meio do Atlântico. E foi então que conheci a Playboy.
Um dia um qualquer leitor, por certo preocupado com as dietas domésticas, perguntava ao editor qual era o teor calórico duma boa mamada. E logo expeditamente ficou a saber que era o equivalente a dois tomates.
O chiste vem aqui ao seguinte propósito. Dei-me conta, nos últimos três dias, de que os dois únicos, persistentes, visitantes deste blogue tinham origem na América: um deles no Middle-West e um outro na Califórnia. 
O caso deixou-me em sobressalto, porque abria a janela e não havia dúvidas; o resto do mundo não deixara de existir. Fiquei-me a congeminar, tudo era fruto, quem sabe, do meu fraco entendimento destes fascinantes mundos, onde tudo parece acontecer sem que nada possa ver-se.
A coisa acabou por se normalizar, a contento geral. E ainda bem. Porque, de facto, numa terra onde o que mais floresce são os banqueiros ladrões e as leituras já citadas, não vejo por que há-de agora um indígena da América transformar este blogue na sua biblioteca privada.

Eufonias

A Praça Velasquez abre-se em meia-lua ali ao Monte Aventino. É um lugar sereno e aprazível. A curvatura dos prédios de quinto andar rodeia um vasto jardim de saibro, que vai resistindo às invasões dos bárbaros e às conspirações modernistas da pedra. E tem lá dentro canteiros coloridos, e relvados aparados, e copas de árvores não domesticadas. Visitam-na as pombas, com alguma parcimónia, as gaivotas não se atrevem a tanto. Às vezes vou até lá.
Em volta há agências bancárias que já tiveram mais agitação, há pastelarias e esplanadas de cafés. E os clientes saboreiam nelas a carícia fugidia dum precário Verão. Ao fim da tarde povoam-nas de óculos escuros e risadas, e trejeitos de cabeça, e fumo de cigarros femininos, e grasnidos de smartphone.
Um dia alguns patriotas, tomados de complexos de soberania, pensaram em chamar-lhe a Praça Sá Carneiro. Atrás das árvores plantaram dois pilares e um baixo-relevo tosco, com palavras que o vento já levou.
Mas o ouvido do povo não se ajeitou à mudança. Chama-lhe Praça Velasquez, respeita as eufonias e evita más lembranças.

quinta-feira, 2 de agosto de 2012

Gore Vidal morreu


E quando morre um escritor americano que...
- acusou Franklin Roosevelt de ter provocado deliberadamente o ataque a Pearl Harbour;
- designou Reagan como um triunfo da arte de embalsamar;
- chamou a G.W.Bush o homem mais estúpido dos Estados Unidos;
- criticou Kennedy pela invasão da Baía dos Porcos e pelo conflito do Vietname;
- escreveu, depois do 11 de Setembro, o artigo O Fim da Liberdade, que a imprensa recusou publicar;
- afirmou que os EUA, em 1998, já não tinham um sistema bipartidário, mas apenas o Partido da Propriedade, da Riqueza e das Corporações;
se designou a si próprio como uma ovelha negra, no meio do bom rebanho branco que, contente da vida, anda a pastar nos campos da República...
... só podemos lamentar que a decência, o pudor e a dignidade sejam espécies em risco de extinção, nas pradarias intelectuais do Novo Mundo.

Síria outra vez

Isto assim é uma grande chatice, não há nada que não venha a saber-se.
Então não é que a CIA dos amaricanos, mandatada há meses por Obama, (ao que a CNN já confessa na América!) tem andado a meter a mãozinha na Síria, aquela triste terra onde um monstro tal e coisa... e uns rebeldes coitadinhos e coisa e tal... aplicando aos indígenas o mesmo guião seguido na Líbia, que acabou como se sabe e ainda vai acabar pior! 

quarta-feira, 1 de agosto de 2012

Os equívocos são como os figos, azedam todos no final do Verão.

Estou de acordo com o Presidente da Câmara de Foz-Côa, que declara rejeitar a ideia de que o Museu do Côa possa transformar-se num elefante branco. Na verdade nada pode transformar-se naquilo que já é, ou mais exactamente naquilo que sempre foi.
Diz um jornal que a 24 de Agosto será palco de uma ópera, acompanhada pela Orquestra do Norte. E acaba de ser dotado de uma cafetaria e de um restaurante, que poderão levar mais gente a visitar o museu. 
Estes equipamentos sempre lá estiveram. Nunca chegaram a abrir porque nunca foram concessionados, porque ninguém concessiona a sua própria ruína.
Depois de arrastadas indecisões e conflitos, criou-se uma fundação para gerir o Museu, na qual entram avulsas entidades. "Uma das prioridades  passa por consolidar o orçamento para 2013 (...)". "Apesar de o orçamento já ter sido aprovado, ainda não está assegurado para 2012". "Por outro lado é preciso procurar meios próprios que permitam fazer crescer a fundação que gere o MC e o PAVC". Por pudor nada se diz sobre o número de visitantes.
O fatal equívoco da barragem do Côa e dos cavalinhos que não sabiam nadar, a que se somou mais outro com o Museu, só tem paralelo no equívoco do Tua, que é exactamente a mesma coisa vista em negativo. Onde podia fazer-se, não se fez. Onde é um crime fazê-lo, far-se-á.
Este Portugal de visionários em roda livre há muito que não tem concerto.

Oh diabo!

Pergunto-me a que propósito andam na TSF Os Vampiros do Zeca.
Ou sou eu que andarei distraído?!

Custa menos!

Em Mitt Romney, um mórmon super-milionário, concentram-se os sonhos da América profunda, essa terra que há-de voltar a ser poderosa, bélica, dominadora. É ele o candidato conservador à Casa Branca, e vai ganhar as próximas eleições.
Um dia destes decidiu vir à Europa, uma terra que ele chama, desdenhoso, "o país de Obama". Um país de súbditos mesquinhos, desprezível e tristonho.
Passou por Londres a visitar os feitores, para mostrar a Berlim que tinha lá ido. Passou por Gdansk a ver velhas amizades, para lembrar à Rússia que a considera ainda o inimigo geopolítico número um. E passou por Israel para deixar avisos ao Irão, para garantir o voto dos judeus e recolher uns donativos de campanha. Não foi de mãos a abanar: 40 doadores meteram-lhe no bolso um milhão de dólares.
O mal maior foi quando abriu a boca. 
Logo falou de Jerusalém como capital de Israel, ignorando a tripartida questão ali centrada.
Ao vir aqui, ao olhar para esta cidade e ver as conquistas do povo desta nação, reconheço o poder da cultura, pelo menos, e de mais algumas coisas: o clima de inovação, a capacidade dos judeus para superarem as adversidades e a mão da Providência!
Depois comparou valores em abono da tese. 
O PIB per capita de Israel andará à volta de 21 mil dólares; o das áreas palestinas mais à volta de 10 mil dólares. 
Conclusão, para quem tivesse dúvidas: uma enorme diferença na vitalidade económica.
Acontece que em 2011, o Banco Mundial atribuiu a Israel um PIB pc de 31 mil dólares, e às áreas palestinas uns míseros 1500 dólares. E viva o velho!
Um estratega assim é um justo vencedor, e eu fico todo contente. Vem-me à cabeça a ideia de que a América, que já teve um dia o seu Passos Coelho, vai voltar a ter outro. É que o mal dividido pelas aldeias custa-nos menos a todos!