1 - A dívida da Câmara da Guarda é de 70 milhões. Qual seja
a vitalidade empresarial, industrial e económica da cidade, e o desemprego da
sua população activa, não sabemos. Mas imaginamos, se nos pusermos a olhar à
nossa volta.
2 - A Câmara da Meda inaugurou o Poli-desportivo Municipal
da Cidade (!), um projecto que envolveu um investimento total elegível de 1,3
milhões, co-financiado em 951.720 € pelo FEDER. O pavilhão surge integrado num
Parque de Infraestruturas Desportivas e de Lazer, do qual fazem parte o estádio
municipal, o complexo municipal das piscinas com interior aquecida e exterior
de ar livre, o parque de campismo, o parque radical e o minicampo de futebol.
Destina-se a dotar o concelho da Meda de um pavilhão para a prática de
actividades lúdico-desportivas, proporcionando aos seus habitantes melhor
qualidade de vida. Qual seja a população total do concelho da Meda, a faixa
etária predominante, e a sua capacidade de produção de riqueza, não sabemos.
Mas claro que imaginamos.
3 - A Câmara de Trancoso vai inaugurar em Outubro o Centro
de Interpretação da Cultura Judaica, um projecto que custou 1,2 milhões e
pretende contar a história da comunidade que viveu em Trancoso nos séculos XV e
XVI. O equipamento foi projectado pelo arq. Gonçalo Byrne, e está-se neste
momento na fase de concepção dos conteúdos multimédia que vão enriquecer o
espaço. Os visitantes vão poder encontrar informações sobre os 700 processos de
judeus naturais e residentes em Trancoso que foram vítimas da Inquisição, e
também elementos sobre os cerca de 300 sinais cruciformes existentes no
município. A abertura do Centro será um acontecimento marcante não apenas para
Portugal mas também para Israel.
4 – Trancoso tem hoje criadas praticamente todas as condições
para ser atractivo, enquanto produto turístico vendável com relativo sucesso.
Para concluir essa estratégia, falta-nos apenas o Museu da Cidade (!) no
Palácio Ducal (o qual já custou ao cofre camarário um pouco menos de um
milhão). O projecto está em curso (no atelier de Gonçalo Byrne, é mais que
certo), e estou convencido que poderemos pô-lo em marcha, e esse seria o último
equipamento para culminar a estratégia de desenvolvimento turístico de
Trancoso.
5 – A parceria publico-privada feita pela Câmara de Trancoso
foi lançada para um conjunto de sete equipamentos, quando o QREN estava
atrasado. Dos sete equipamentos executámos apenas três, que nunca poderiam ser
financiados pelos fundos comunitários. Fizemos a Central de Camionagem, o Campo
da Feira e o Centro Cultural de Vila Franca das Naves. Retirámos da parceria o
Museu Judaico e o Museu da Cidade, tendo-se desistido do Museu do Tempo, porque
não havia condições financeiras para o fazer. Em causa ficaram 8,5 milhões, a
pagar em 25 anos, com encargos anuais de cerca de 800.000€. Não sabemos qual
seja a população do concelho, (talvez 9 mil boas almas), nem quanta dela voltou
à emigração, nem que riqueza específica produz, nem quantas vezes abrirá por
ano o Centro de Vila Franca, nem o que acontecerá ao rossio da feira se um dia os
encargos não forem liquidados. Não sabemos, mas claro que imaginamos.
6 – A última reforma administrativa do território, tão
antiga como o Mouzinho da Silveira, já tem uma eternidade. E era urgente uma
nova reforma, porque o mundo entretanto mudou muito: para tornar mais racional
a nossa vida colectiva, e para combater esta hidra delirante de autarcas
megalómanos e fantasistas, que anda há muito a procurar os caminhos do progresso,
percorrendo os atalhos da nossa decadência. A hidra possui incontáveis cabeças.
E quanto mais elas são, mais variam as formas da ruína.
7 – Esta troika que nos aperta a cilha, e que estas falsas
elites de serventuários mandaram vir para tratar das nossa dívidas, sabia à
partida que uma forma de reduzir a despesa era cortar à hidra algumas das
cabeças. Por isso impôs aos relvas a reforma do poder local. E o Relvas ainda
fez os primeiros ensaios.
Mas quando falou na redução de municípios caiu-lhe o Carmo
em cima. O poder dos municípios, principal esteio e razão de ser do PPD, não
podia tolerar que lhe mexessem no quintal. E à voz do Ruas logo o Relvas se
calou. A reforma administrativa ficou limitada à extinção de mil e tal
freguesias. E deste modo, pela mão do Relvas, em lugar de se fazer o que deve
ser feito, far-se-á o que não devia acontecer.
A poupança de três milhões é insignificante e desprezível no cômputo geral. A
extinção de freguesias onde já não há escolas, nem padres, nem serviços de
saúde, nem finanças, nem tribunais, em regiões onde elas já são a única
presença do estado soberano, acentua ainda mais o doloroso abandono. E a
ausência quase total de discussão pública democrática, em ordem a encontrar as
melhores soluções, apenas induzirá tensões e conflitos e vesânias, sem qualquer
benfeitoria.
A hidra dos autarcas visionários, que o Relvas superintende,
prosseguirá o percurso dos seus negócios e da nossa decadência, se não for
antes o da nossa ruína e da nossa miséria. E os culpados somos nós, porque
comemos demais, como eles dizem. Porém, custe o que custar, Portugal há-de
voltar a ser o que foi sempre, desde há 500 anos. Uma pátria de enjeitados, governada por traidores.
NOTA: As citações são do jornal "O Interior".