sexta-feira, 25 de dezembro de 2015

Decadência

É suposto ser a revista LER um objecto útil aos leitores. Facto que, como tudo o que é suposto, é falso. Porque a revista LER, para além de ser caríssima, não serve para nada. Cá por mim, a última que comprei (Nº 140) foi mesmo a última!
Salvo a notícia minúscula duma ou outra edição, e exceptuando as três páginas de Inês Pedrosa, não há em toda ela senão vulgaridades, ou inutilidades, aleivosias de mercado e semelhantes. Quer dizer, por seis euros... é só fazer as contas ao preço de cada página!
Doze páginas são de chirichia sobre uma grande guerra que houve no século passado, entre o Pacheco e o Cesariny; outras doze são duma entrevista com Francisco Bethencourt, professor de História no King's College, sobre Racismos: das Cruzadas ao Século XX,*** um assunto sério mas de nicho; oito páginas são de uma entrevista duma Anabela armada ao pingarelho, a um Gonçalo M.Tavares particularmente enigmático e exótico, conforme é apanágio dos génios precoces. 
Sendo sabido que a crítica digna desse nome deixou praticamente de existir, tudo o resto é palha enfardada. Não era preciso tanto, como demonstração da nossa decadência.

*** "O colonialismo português é um colonialismo low-cost, é um colonialismo com pouca capacidade de manpower. Até ao séc.XIX o povo português foi o povo europeu que emigrou mais, mas emigrou sobretudo para as Américas, porque a Ásia era mais complicado por causa da taxa de mortalidade. A viagem para o Brasil era de dois meses e para a Índia era de seis. E as pessoas nunca são burras. Aquela ideia de que as pessoas, por não serem letradas são burras, é falsa. As pessoas fazem escolhas muito racionais. Como os portugueses mandavam poucas pessoas para a Ásia, promoveram as relações raciais e promoveram elites locais mistas, porque não tinham outras possibilidades e isso distingue-os dos holandeses. Porquê?! Porque estes misturam-se mas não dão estatuto político a essa população. Os holandeses tinham uma capacidade de recrutamento enorme nas regiões do que é hoje a Alemanha e da Escandinávia. Eles mandaram para a Ásia um milhão de contratados, e só começaram no início do séc XVII. Os portugueses não tinham isto e promoveram os casamentos mistos. No Brasil é uma situação oposta porque a maioria da mão de obra era composta por escravos africanos. Portanto os portugueses misturavam-se com escravos africanos num modelo de domínio económico e social, porque precisavam de um nível intermédio de raça mista, de maneira a dominar uma população cuja vasta maioria era escrava e africana. Há ali um tradição de mistura juntamente com racismo. O colonialismo português é tão racista como os outros, mas tem uma prática de mistura racial devido a estes elementos. Nos Estados Unidos, ou nas colónias inglesas da América do Norte havia muito mais emigração de mulheres e casais e não se punha tanto o problema. Essas coisas são muito importantes. E depois criou-se na América do Norte, quer entre os ingleses quer entre os holandeses, uma maior repulsa em relação a misturas. (...)»