segunda-feira, 25 de agosto de 2014

Leitura(s)

Dos pontos de vista expressos quando esta obra saiu, em finais de 2012, chegaram-me ecos bastantes. E um deles houve que me deixou perplexo. Ainda hoje me deixa, e é só por isso que volto à vaca fria.
A obra é um relato de viagem, a começar num ponto e a acabar noutro, a percorrer mil lugares. Nenhum deles vem no mapa. São tão insignificantes que só existem no texto. E o viajante (confessa-o mais que uma vez) vai à procura dum país (que é o seu).
No final termina, resumindo: Agora de longe veio, à procura dum país, sem o achar. Que Portugal nasceu do capricho dum príncipe. E dele nem os portugueses fizeram um país, distraídos a vadiar por sertões a cavalo no vento, nem encontraram, no vasto mundo inteiro, quem por eles o fizesse. Ficaram com a paisagem, que povoaram de desespero. E acolheram-se a uma loucura mansa e fatalista, que pastoreia as almas devolutas e ilude a realidade. Precariamente sobrevivem nela. (...)
Este leitor começa por confundir o viajante, (que é o locutor do discurso e só existe lá dentro), com o autor que produziu o texto, e peregrina cá fora. Mas isso não é, neste caso, um pecado capital.
O que mais me intriga na sua leitura é quando afirma: É um olhar de crónica magoada e pessimista, este de Jorge Carvalheira, que parece procurar a desgraça e o confronto, numa pose de superioridade moral (...) mas também numa aceitação impotente do fado lusitano.
Ora este Jorge Carvalheira reconhece a todos os leitores a liberdade inteira de serem simples e optimistas, de terem alma humilde no lugar duma arrogante, de lerem com mais proveito as obras pias da auto-ajuda, de usarem nos olhos filtros cor-de-rosa, ou mesmo palas de mula. Respeita-lhes essa liberdade. E reivindica a sua, de não fechar os olhos como autor.
Mas o pior vem no fim. A obra aparenta uma vindicta pessoal contra o destino, como se fosse possível vingar a vida numa viagem. Lê-se, por isso, como um romance.
Este leitor vê, na leitura dum romance, um exercício que não leva a sério. Faz mal, mas isso é com ele, disso não se trata aqui. Menos sério ainda é lançar mão duma pretensa crítica psicanalítica, e pôr-se a diagnosticar as motivações do autor. Ainda por cima este autor que afinal é um desperado, um inconformado com o destino, um revoltado com a sua mala-sorte, que escreve um livro para se vingar de tão madrastona vida. 
Há leitores que nunca farão ideia da canseira que dão. Quanta vez sem a merecerem.