quarta-feira, 23 de março de 2016

Não sei o que andam a fazer as andorinhas

Saio ao alpendre a sondar o horizonte. Olho e vejo, depois ouço. Céu fechado em cerrados alto-estratos. Numa aberta, lá por cima, andam cúmulos esparsos, luminosos, a embebedar-se de azul. Bons augúrios, no amanhecer tristonho. 
Na semi-obscuridade a passarada galreja. E o cuco, além na encosta fronteira, madrugou e não se cala. Eu registo.
Só não sei o que andam a fazer as andorinhas. Vieram aqui, voltaram, reconheceram o barro e ausentaram-se. Talvez confiem que a forneirita respeite a propriedade alheia, engano seu. Ou foram ler as notícias ao café... e ainda estão de boca aberta. Pois pudera!


"vês como vibra a minha pele quando a baloiça o vento?

sob a minha pele há tímidas flores amarelas
e ervas secas a querer verdejar
e trocam-se os perfumes por vozes a roçarem a pele

vês como baila a minha pele quando as aves me cercam?

(não sentes o sangue oculto das papoilas?)"
[ (eu diria que nevava), Maria Afonso, ed.CanalSonora, Tavira, 2016]