terça-feira, 15 de março de 2016

Destroços de marés na nossa praia

Os adultos falavam, nesse tempo, do mulato da Torre. Nunca o vi, mas guardei dele uns ecos na lembrança.
A Aninha era uma das filhas duma ninhada grande. E tinha um irmão no Zaire, que por lá ficara rico. Mandou ir ter com ele as três irmãs mais novas. E lá foram.
Um dia a Aninhas deixou de resistir aos gritos das hormonas. E tomou parte, a seu modo, na gesta gloriosa lusitana, em que tantos eram poucos.
Mais tarde voltou à Torre, e trazia pela mão um sobrinho mulatito. Lá ficou e lá cresceu, lá morreu aos vinte e tal, afogado em aguardentes. 
Quando à noite regressava, já toldado, dava mau serão à Aninha. Ela fechava-lhe a porta. E logo ele: - Se me não abres a porta, eu digo-lhes a verdade, és minha mãe! Pois no povo nunca passou dum sobrinho, normal filho duma preta que o irmão tinha estendido debaixo duma palmeira.
Ela engolia e escancarava-lhe a porta. E agora já ninguém se lembra disso.