[Execução de Luís XVI, 21 de Janeiro de 1793]
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«(...) Lavoisier teve mais sorte com o esquema da construção duma grande muralha à volta de Paris para impedir o contrabando, estimado em cerca de um quarto de todas as mercadorias e mantimentos que entravam na capital. (...) Paris ficou envolvida por uma muralha de vinte e tal quilómetros de extensão, realçada por seis barreiras ou pavilhões magníficos (as portas principais da Alfândega), mais sessenta repartições de impostos. Como era de esperar, o esquema não contou com a benevolência dos habitantes, pôs Paris a murmurar ("Le mur murant Paris rend Paris murmurant...") e durou pouco tempo. Com a Revolução de 1789, a Ferme Générale foi das primeiras coisas a ser abolida, e boa parte da muralha e várias Portas de Alfândega foram incendiadas e destruídas pela população. (...)
Como padrinho de obras e legislação controversas, Lavoisier era objecto de uma publicidade negativa. Na frente científica também fora criando inimigos poderosos. O mais acirrado era Jean-Paul Marat, um médico ambicioso, com pretensões a filósofo e cientista, oriundo do cantão de Neuchâtel, na Suíça. (...) Como médico dos ricos ganhou influência, mas queria fama e entrar à viva força na Academia das Ciências. (...) Coube a Lavoisier denunciar as pretensões do arrivista, que clamava ter isolado o tal elemento do fogo. Marat nunca entrou na Academia, e Lavoisier ganhou um inimigo figadal para o resto da vida. Sem se aperceber disso, Lavoisier ia acrescentando achas à fogueira do seu trágico destino. No Verão de 1793 Marat seria, com George Danton e Maximilien de Robespierre, um dos três homens mais poderosos de França. (...)
Perante o amontoar de crises, Luís XVI foi aconselhado a convocar os Estados Gerais, que não se reuniam desde 1614. (...) É justo dizer que Lavoisier defendia as ideias progressistas duma monarquia constitucional - nem outra coisa seria de esperar dum iluminado que, embora nunca tendo saído de França, conhecia e privava com algumas das maiores figuras da cena internacional, inglesa e americana. Aos olhos do povo, porém, estava demasiado enredado na Ferme Générale [recolha de impostos]. (...)
Lavoisier ia aguentando quase tudo com o estoicismo dos homens inteligentes de consciência limpa, mas no final de 1790 parecia decidido a renunciar à política para se dedicar exclusivamente à pesquisa científica (fenómeno da respiração) e quando muito a acções de carácter social. "No silêncio do seu laboratório, o físico também pode desempenhar as funções de patriota". (...) Entretanto a Assembleia tomara conta do Tesouro Público e nomeara uma comissão de seis membros - entre os quais Lavoisier - para o administrar. O patriota não resistira, uma vez mais, a dar a sua colaboração. (...)
Entretanto Marat, virado panfletista, atacava-o duramente no seu pasquim, L'ami du peuple. Lembrava que o famoso químico fora responsável pela construção da muralha da capital, que impedia a circulação do ar e sufocava Paris (!), listava os múltiplos cargos do seu inimigo, chamava-lhe o "corifeu dos charlatães". (...)
O círculo apertava-se em torno de Lavoisier. Fechadas as Academias (1793), nada impedia que os académicos continuassem a reunir-se em comissões e a continuar o seu trabalho, como aconteceu com a comissão de Pesos e Medidas. Nas palavras de Lavoisier, a grande reforma do sistema de medidas era "um momento erigido à glória da Revolução Francesa". O pai da química também se envolveu nos problemas da educação pública, que se queria livre, laica e apolítica. (...) Preconizava uma instrução primária universal e gratuita, e uma instrução secundária com relevo nas ciências, pois "as artes, as ciências, as próprias letras são unidas por laços invisíveis que não se podem romper impunemente". (...)
Julgado pelo Tribunal Revolucionário a 8 de Maio de 1794, foi condenado à morte juntamente com 37 fermiers généraux, e todos guilhotinados em pouco mais de meia hora na Praça da Revolução (hoje da Concórdia). (...)»