Quando a troika
meteu aqui as patas, depressa viu que um dos cancros da despesa residia na
legião de autarcas locais megalómanos e tomados da febre do pugresso, que durante décadas mais ganhavam
eleições quanto mais obra fizessem. Os munícipes tristonhos aplaudiam, porque o
senhor presidente era homem de acção, era o melhor para a terra.
E foi um rematado
regabofe, com o país inundado de empresas municipais para aldrabar as contas, e estádios, centros
culturais, auditórios, piscinas quentes e frias, de interior e de exterior,
complexos desportivos, rotundas, pousadas e obras inúteis. Tudo para o bem dos
munícipes, claro. Para muitas dessas inutilidades já chegou a hora de fechar,
porque não há utentes nem orçamentos que as possam manter abertas. A maior
parte das restantes estão na calha.
Por outro
lado, a actual divisão administrativa vem do tempo do Mouzinho da Silveira,
outra diferente é imposta pelas realidades da vida, da economia e da história.
A reforma e redução de municípios era imperiosa, e a crise financeira era um
bom pretexto para a realizar. A troika deu ordens ao Relvas para actuar.
Tudo bem, até
aqui. Só que, quando o Relvas veio à fala com o Ruas, da associação de
municípios, o tipo ladrou-lhe grosso e mandou-o bugiar. Sucede que o poder
autárquico tem sido o sustentáculo maior dos partidos da direita, e tem servido
muito bem a oligarquia que aí está. O triste do Relvas meteu o rabo entre as
pernas, e reduziu a urgente reforma administrativa à extinção atrabiliária de
mil e tal freguesias. É uma desgraça! Por um lado, não está nas freguesias a
cabeça da hidra responsável pela dívida da maior parte dos municípios, nem é a
sede da corrupção, das negociatas, do nepotismo e do caciquismo.
Por outro
lado, num país desertificado em grande parte, em lugares onde já não há padre, nem escola,
nem saúde, nem tribunal, nem finanças, retirar a junta de freguesia é
aprofundar o abandono das pessoas a si mesmas. Um rebanho tresmalhado em lugar dum país.
Acresce que
todo o processo foi posto em acção sem discussão colectiva, donde poderia sair
qualquer solução minimamente consensual. Porque cada caso é um caso. Eximindo-se ao que era seu dever e responsabilidade, a maior parte das assembleias municipais não promoveu qualquer debate. Tudo foi
imposto de cima. E a única coisa que daqui pode resultar é a cizânia e a balbúrdia, a divisão e o mau-viver, para não falar em pequenos ódios à solta. Um rebanho tresmalhado em lugar dum país. Mas do Relvas quem é que esperava outra coisa?!