quarta-feira, 13 de fevereiro de 2013

HAJA LUZ! - 14

«Várias décadas passaram sobre a morte de Gusmão, até que os ecos do feito dos irmãos Montgolfier em 1783 ressuscitaram o interesse pela aeronáutica em Portugal. O episódio seguinte teve como protagonista outro padre. A 3 de Abril de 1784, um dos membros fundadores da Academia das Ciências de Lisboa, o padre João Faustino, fez subir, perante os soberanos no palácio da Ajuda, um balão de ar quente com 15 metros de diâmetro. O balão manteve-se no ar durante 20 minutos, atravessou o Trjo e foi cair em Cacilhas. Parece que nesse mesmo ano o padre Faustino realizou mais três ascensões, uma delas com um macaco. Também há notícia de que em 1784 o padre Jerónimo de Allen espantou os lisboetas com uma subida em balão. (...)
O curioso é que Lunardi também veio a Lisboa. Após os sucessos na Grã-Bretanha, viajou pela Europa, fez voos de demonstração na sua Itália natal e em Madrid, e em 1793 chegou à capital portuguesa. Lunardi montou uma barraca no Terreiro do Paço e aí instalou o globo aerostático para gáudio do público que pagava 100 réis por entrada (o preço baixou depois para 20 réis ou um vintém); aos domingos fazia-se a demosntração da preparação do hidrogénio.
O pior é que Lunardi caiu sob a alçada do intendente geral da polícia, o famigerado Diogo de Pina Manique, que o mandou prender a pretexto dumas licenças e editais. Correram uns boatos que o acusavam de feitiçaria, ou no mínimo de ser uns estrangeiro dado a actividades subversivas. Com o tempo tudo se foi esclarecendo, e Lunardi obteve as necessárias autorizações. Depois de vários adiamentos, a viagem aérea ficou marcada para 24 de Agosto de 1794, das três às cinco da tarde, tendo o anúncio sido feito no recém-construído Real Teatro de S. Carlos. Pelo sim, pelo não, Pina Manique mandou infiltrar a multidão de espectadores com polícias à paisana.
No Tejo apinhavam-se as embarcações apinhadas de gente para ver de perto a proeza. Pouco depois da hora aprazada, eram 4 horas e 40 da tarde, Lunardi subiu no balão até à altura duma légua e ficou a parar sobre o Tejo, para regalo de todos, durante quase uma hora e meia. O resto da viagem foi muito acidentado. Chuva e vento irregulares fizeram o balão perder altura, Lunardi deitava lastro borda fora ou deixava entrar ar para fazer subir ou descer a aeronave, que ora roçava a terra ora subia demais. O aeronauta acabou por aterrar a duas léguas de Vendas Novas, por volta das oito horas da noite. (...)
Lunardi veio a falecer em Lisboa em 1799. Apesar de Pina Manique, deve ter por cá ficado.»