Encontro-os na caixa do supermercado, sentencio-lhes vinte e oito anos. E logo me salta à vista o mar de silêncio em que naufragam.
Ela manuseia o carrito das compras, onde esperneia um bebé. Ele vai de olhos pregados no ecrã dum telemóvel. Não parece caber lá o futebol da televisão, menos ainda um filme libertino. Mas não sei.
Ela entende-se com a menina da caixa, guarda os plásticos das compras, tira a carteira do saco e estende ao marido um cartãozito vermelho.
Ele tira os olhos do ecrã e integra-se na cena. Introduz o cartão no terminal, picota um número secreto, espera breves segundos. Logo o devolve à mulher e mergulha outra vez no telemóvel.
Explode-me na cabeça a ideia insidiosa de que ela guarda o cartão mas não conhece o código. Suspeito mas não sei.
Lembro-me dum estudo, há tempos, no jornal: uma grande percentagem das jovens escolares alegaram violência relacional. E viam nela manifestação de amor. Eu achei muito estranho, mas não sei.
Partem ambos e deixam-me a pergunta envinagrada: de que estarão à espera estas mulheres, para começar a pôr os cornos aos maridos? Ou já terão começado?! Não é nada comigo, mas não sei.