No tempo em que os animais ainda falavam na Europa, os
portugueses viviam na Idade Média. Mas já havia modernidade e arte pura neste mundo. Foi por
então (1965) que Antonioni realizou esta pérola das artes cinematográficas.
A História dum Fotógrafo é o mergulho na sociedade
inglesa da época, mormente de Londres. E vem recheado de episódios antológicos: a persona do fotógrafo que se desloca em Rolls-Royce, as noites da juventude londrina desse tempo premonitório, a cena
final do jogo de ténis num parque, em que não havia bola, mas é exactamente
como se houvesse.
Casualmente, o fotógrafo captura imagens num parque
londrino. E só mais tarde, nos seus trabalhos de câmara escura, vem a descobrir
que fotografou um assassinato. Volta ao parque e vê o cadáver, estendido no
relvado. Agitado, procura o seu editor. E é enquanto o procura que nos permite
o acesso à noite londrina: a liberdade à solta, as drogas, a cultura
alternativa, a alienação, o simulacro, a violência, a ratoeira da indiferença…
Quando, num desalento, volta ao parque, o cadáver já tinha desaparecido. E vem
a cena final do simulacro vazio.
Nesse tempo vivia Portugal (Lisboa, que o resto não
existia!) nas trevas da Idade Média. Mas cinquenta anos depois chegámos lá.
Quem, a duras penas, lá chegou.