Em Novembro, quando os castanheiros se vestiam de fulgores antes de adormecerem, passavam na vereda escuros vultos. Eram viúvas, arrimadas num apoio, com capas improvisadas. Traziam no braço, nas cestas de verga, as últimas castanhas, e os martelos de madeira da função.
Os homens delas morreram há muito e algumas têm pena. Quando eram vivos, a aldeia fervilhava de gente que não tinha um palmo de terra onde plantar uma couve. As terras tinham dono, os castanheiros eram dos senhores, os pinhais eram dos senhores que viviam lá longe. Há trezentos anos que o mundo se não movia, num silêncio medievo. Nesse tempo eram eles que iam lá a casa a arrecadar as castanhas do dia, que apanhavam de meias, ou de terças, ou de quartas. A casa também era dos senhores e o meu pai era o feitor.
As coisas começaram a mudar a partir de 60, quando os servos da gleba se puseram a fugir para as obras de França, pela mão de passadores. Os senhores foram vendendo as terras a troco de moeda forte. Mas a idade média só deu sinais de findar quando Abril aconteceu e cá chegou.
Hoje são elas as donas dos castanheiros ainda vivos. E são elas que passam, em Novembro, uns vultos alquebrados de guardiãs do mundo. Lá estarão para lhe fechar os olhos, se um dia ele acabar.