Li não sei onde que o último romance de António Lobo Antunes, Da Natureza Dos Deuses, é o melhor de todos eles. Não faço ideia nenhuma. Exceptuando as Crónicas, em que é insuperável, há muito que o não leio.
Houve um tempo em que o Lobo Antunes e o Saramago, cada um deles a seu modo, foram inovadores e salvíficos para a nossa literatura. Puseram a Europa a ler-nos. Depois disso, cada um deles a seu modo, tornaram-se irrelevantes. E ao fim duma dúzia de obras o Antunes assumiu a condição de génio. Passou a tratar em conformidade a literatura e os leitores e deixei de o ler.
O livro está ali no escaparate da livraria, uma tentação de 600 páginas. Na contra-capa cita o El País: "Um autor com uma facilidade prodigiosa para enlaçar obras-primas, que dentro de cinco mil anos, em argila ou em pó de estrelas, continuarão a ser lidas com paixão."
E eu, que me perco por paixões e nessa altura já cá não estarei, decido arriscar-me pela última vez. Faço a promessa de não desistir na página cinquenta e vou lê-lo até ao fim.
Desistia, se pudesse, a meio da sessão das 19 horas, ali no São João: O Doce Pássaro da Juventude, de Tennessee Williams, encenação de Jorge Silva Melo.
Os incómodos assentos de pau, onde as cadeiras não cabem e os cotovelos sobram, são coisas que já não existem. Se tivesse escolhido um lugar na plateia estava frito. Actores há que à má dicção somam a pressa, um tempo inadequado. Outros há que têm peito mas berram.
A toada geral é narrativa, não há tensão dramática nem pathos, conforme os modernos usam. As personagens estão ali a falar, a certa altura calam-se todos, acendem as luzes, a plateia bate palmas, sabemos que acabou.
Esqueci-me de ficar perto da coxia, para sair mal me agradasse. Lá fiquei até ao fim.