quarta-feira, 20 de janeiro de 2016

CEP 9

No dia 5 de Julho / um facto aconteceu / vinha uma patrulha alemã / quanta vinha quanta morreu.
Era meia noite em ponto / quando vinha o inimigo / a sentinela deu conta / logo lhe deu fogo vivo.
Estavam 6 camaradas / todos naquele posto / foram os que os mataram / que aquilo foi um gosto.
No fim foram-nos buscar / para serem enterrados / só um é que estava ferido / e os outros estavam estrumados.
E aquele que estava ferido / não fazia se não gemer / um deles logo o acabou / para não estar a padecer.
Um rapaz da minha terra / também os ajudou a matar / e depois de todos mortos / ainda os ajudou a acarretar.
Acarretava-os todos às costas / mas aquilo de repente / para o peso que lhe faziam / disse que nem lhe parecia gente.
Outros levava-os de rastos / como o cilindro na estrada / ainda depois de mortos / lhes dava pandeirada.
Nós fazemos este serviço / mas não é de coração / é porque somos obrigados / a andar com arma na mão.
É uma vida muito triste / já muito o tenho pensado / foi sorte que deus nos deu / já o tínhamos determinado.
Andamos cá três rapazes / todos 3 da mesma terra / em má hora nós nascemos / para virmos para esta guerra.
Nós somos 3 infelizes / e sorte que na gente cai / 2 já não têm mãe / outro não tem mãe nem pai.
É uma coisa que causa pena / já nenhum (de nós) termos mãe / quando ela é a maior alegria / que a gente no mundo tem.
Quando marchei para a França / de tudo me despedi / de toda a minha família / mas minha mãe não a vi.
Despedi-me de meu pai / que tanto bem me queria / que o não tornarei a ver / adeus meu pai até um dia.
Meu pai estava a chorar / porque me não tornaria a ver / que vinha para esta guerra / vinha sujeito a morrer.
Eu respondi a meu pai / não chore nem tenha paixão / que eu se morrer na batalha / é a defender a nação.
Ainda estou bem verto / quando meu pai me deu a mão / quando andasse a combater / que me lembrasse de S tião.
Dei um adeus a meu pai / com um bocadinho de riso / adeus meu pai até um dia / será dia de juízo.
Esta minha despedida / a meu pai causou paixão / em vir morrer desta idade / por causa do alemão.
Deu-me o último abraço / e não me queria deixar / adeus meu filho adeus / que não tornas cá a voltar.
Os meus irmãos coitadinhos / custiu-lhes ver-me abalar / adeus meu irmão adeus / vais passar águas do mar.
Um meu irmão mais velho / custou-lhe mais do que a morte / de 3 irmãos que nós somos / só a ti te calhou a sorte.
O que custava a meu pai / não saber para onde eu ia / adeus meu filho adeus / deus vá em tua companhia.
Eu não sei para onde vais / já te não torno a ver / palpita-me o coração / que vais para a França morrer.
Vai-te embora adeus meu filho / eu fico aqui sozinho / vais para a frança a combater / adeus adeus meu filhinho.
Se não morreres torna a vir / tu bem sabes onde estou / vais cumprir o teu dever / porque a sorte te calhou.
Enquanto não tornares a vir / nunca mais tenho alegria / quando andares a combater / a ver se tens valentia.
Já sei que vais para a guerra / sujeito a todo o perigo / palpita-me que vais morrer / com balas do inimigo.
Só em ti calhou a sorte / meu filho que és soldado / esta tua despedida / imita um degredado.
Umas penas como estas / nunca pensei que sofria / em abalares para a França / a quem tanto bem eu queria.
Esta guerra é terrível / como nunca vi nenhuma / tanto homem por lá fica / sem terem culpa nenhuma.
Isto não havia de ser assim / os soldados a combater / haviam de ser os ministros / que querem enriquecer.
Obrigam-te a ti a vir / e muitos mais soldados / e (des!) sujeitos à morte / e eles estão descansados.
Logo que a sorte te calhou / meu filho vais abalar / a senhora do livramento / é quem te pode salvar.
Eu fico aqui já velhinho / não sei para onde hei-de ir / todos os dias lhe rezo / e por ti lhe hei-de pedir.
Fui eu que te criei / para teres esta desgraça / não imaginas meu filho / a paixão que por mim passa.
Eu choro e tenho pena / porque vais muito arriscado / vais sujeito a ficar lá / por das balas seres varado.
Despede-te de toda a gente / desta nossa povoação / que não tornarás cá a vir / a todos pede perdão.
Tu tem um bom coração / não te importe de malícias / enquanto por lá fores vivo / manda sempre as tuas notícias.
Não demores as tuas cartas / para este teu pai querido / vai ao menos escrevendo / enquanto fores vivo.
(Cont.)