« (...) Nunca discuti, nem jamais discutirei com quem quer que seja,
o valor literário duma obra minha. Um livro atirado ao público equivale a um
filho atirado à roda. Entrego-o ao destino, abandono-o à sorte. Que seja feliz
é o que eu lhe desejo; mas, se o não for, também não verterei uma lágrima. Não
faço versos por vaidade literária. Faço-os pela mesma razão por que o pinheiro
faz resina, a pereira pêras, e a macieira maçãs: é uma simples fatalidade
orgânica. Os meus Livros imprimo-os para o público, mas escrevo-os para mim. (...)
A nossa obra é o nosso monumento. Não o cerquemos de grades
de ferro, com sentinelas armadas para o proteger, nem desperdicemos a
existência a doirá-lo constantemente de novo a oiro fino, a brunir-lhe as
asperezas com o esmeril dulcíssimo do amor-próprio e a sacudir-lhe as teias de
aranha irreverentes com um espanador (!) feito de grandes caudas de
pavão. (...)
Sim, o crítico dos críticos é só ele - o tempo. Infalível e
insubordinável. As grandes obras são como as grandes montanhas. De longe,
vêem-se melhor. E as obras secundárias, essas, quanto maior for sendo a
distância, mais imperceptíveis se irão tornando. Não falo de mim, porque não
sou vaidoso nem orgulhoso. A vaidade é o orgulho dos imbecis e o orgulho é a
vaidade dos génios. Ora eu francamente não pertenço a nenhuma dessas
categorias. O triunfo, o aplauso público, a rajada de incenso não tem o dom de
me embriagar Não me estonteia o cérebro a vulgar monomania das grandezas
literárias. (...)»
[Guerra Junqueiro, 1887. Prefácio à 2 edição de A Velhice do Padre Eterno]