domingo, 2 de novembro de 2014

Weltliteratur

No último Ípsilon, António Guerreiro abre-nos o cartucho do Prémio Leya (cem mil euros, recentemente atribuído), desenrola o novelo que ele de facto é, e aponta o que isso significa para a literatura. Tudo bem diverso do que imaginamos.
1)
- O júri é constituído por 7 (sete) destacadas personalidades do mundo literário e cultural;
- A escolha do júri é feita sobre um corpus de dez inéditos, no máximo;
- As centenas de trabalhos concorrentes são previamente seleccionadas pela editora, segundo critérios que hão-de ser tudo menos neutros; 
- O autor premiado abdica de direitos de autor até aos 85 mil exemplares vendidos;
- E "cede à Leya o direito exclusivo de explorar comercialmente (o livro) sob todas as formas e em todas as modalidades, em todo o mundo";
- Isto é, não existe aqui prémio algum. Há um contrato comercial, onde alguma alínea obscura incluirá um prestígio simbólico e imaterial, avalizado por destacadas personalidades.
2)
- A concepção de uma literatura como objecto autónomo cedeu aqui lugar a um produto literário do género editorial.
- E este editorialismo define hoje uma "literatura mundial", que nada tem que ver com a Weltliteratur de que em tempos se falou. Esta "mundialidade" literária não é o estado de um conjunto de obras, é o produto que sai duma "fábrica do universal".
- Por este caminho, para onde vai a literatura? - [pergunta A. Guerreiro, que responde]: vai no sentido do seu desaparecimento, ou pelo menos de uma forma de desaparecimento que nos faz ver claramente quão exíguo é o espaço público que lhe está reservado.
3)
Há nos trabalhos de Tordo uma grande vantagem: ele sabe o que é uma história, e conta-a com eficácia. O que lá vem dentro, e para que serve, é outra questão. 
É literatura de sala de espera, que alguns académicos confusos misturam com cosmopolitismo, sem darem conta dos equívocos em que nos encurralam.
Ou a obra literária rompe dum húmus cultural próprio, ou é um produto de mercado semelhante aos pepinos. Que são iguais aqui, ou na Finlândia, ou na ilha da Taprobana.