quinta-feira, 16 de outubro de 2014

Ao café

A manhã, tão chuvosa e turbulenta, impeliu-me a duas horas de leitura matinal num estanco do bairro. Mas depressa dou comigo numa assembleia popular, que analisava um título do jornal: os portugueses trabalham mais 300 horas por ano do que os alemães.
A duração do trabalho não surpreende ninguém, vem na estatística e será verdade. Já importante é centrar a única questão, como é que os portugueses gastam as horas de trabalho.
A assembleia conclui o que já era sabido: os obreiros portugueses cumprem tão bem ou melhor que os outros europeus, não há ninguém que o não saiba. O que falta às empresas muitas vezes é uma gestão competente. As estatísticas dizem que o nível escolar dos gestores de Portugal é mais baixo do que o dos seus funcionários. Esse facto não diz tudo, mas quer dizer muita coisa.
E nem é surpreendente, atento o legado histórico. Há séculos que a gesta gloriosa e as aventuras do mar dispensaram as elites de administrar o país, de o organizar em termos produtivos, de lhe inventar uma economia. Ainda hoje se ouve, navegar é que é preciso! Semear padrões numas dunas ignotas, trocar missangas por milho num sertão, fazer mulatos nas pretas debaixo dum embondeiro. 
Desde o séc. XVI, as elites reduziram este quintal português a ser viveiro de gente, que transformaram em gado de exportação. Desse tráfego viveram desde então. Raramente isso foi claro como é hoje, governados que estamos pelos netos desses negreiros!