segunda-feira, 15 de junho de 2015

Patos-bravos

Os patos-bravos moram cá em baixo, à volta da represa, mas vão fazer criação nas cumeadas da serra. Vá-se lá saber porquê, se não for para inculcarem aos filhos uma visão abrangente do mundo, de alta cota. E só descem no fim do propedêutico.
Este, que é fêmea, apareceu um dia a coxear, a meio do caminho, num logradouro do povo. Amparado por um cristão entrou no gado doméstico. Esqueceu as cotas altas, sobreviveu a comer pepinos tenros, foi ali um cabo dos trabalhos. Porém sobreviveu. E hoje em dia lá vai, a manquejar, de geração atrás, entre as férias na Figueira e uns banhos na Granja. É ela a matriarca do logradouro inteiro.
A saga familiar tem registadas malfeitorias várias: da raposeta matreira, de algum cachorro em precisão aguda, o gavião nunca foi ao pelourinho. Porém ultimamente aconteceram surpresas, há vários desaparecidos, investigações em curso. Fala-se de ratazanas emboscadas nas dálias, que não desdenham um patito distraído. Ou de cobras, que acordaram do inverno na parede e andam esfomeadas.
A pata coxa lá vai, à frente da filharada, indiferente ao sobressalto. Enquanto sobrar alguém a galrejar atrás não perde a compostura.
Faz-me lembrar uns lorpas que eu cá sei. Só se dão conta quando não restar nenhum, e é então que arrancam os cabelos!