segunda-feira, 29 de junho de 2015

Harmonias

Vão sentados no lugar do meu bilhete, eu concilio e tomo lugar ao lado. Ele fala axim, ela não fala, antes grasna. Tem na garganta uma cana rachada, sopra naquilo e fura-me os tímpanos como um berbequim. Esforço-me por seguir as peripécias dum romancinho que um amigo escreveu e eu vou lendo. Eles não deixam, a ladrar em alta voz sobre o Direito que exige um grande encornanço, e do CEJ que fabrica juízes em dois anos, da Gestão e da Arquitectura, e dos tipos da Lusíada que têm as melhores notas,  e das praxes dos caloiros com padrinhos e com tudo. 
Falam da praxe como se fosse actividade académica, justificação de vida, um dever do cidadão, como se fosse a cor duma anilina com que pintam os focinhos para se distinguirem do resto da carneirada que apareceu na romaria.
Saio numa paragem a fumar um cigarro, enquanto entram outros viajantes. Um deles reclama o meu assento e temos que mudar tudo.É assim que me livro deles e prossigo o romancinho, e me regozijo com as harmonias secretas que este estranho mundo esconde.