Anda nele um Don Juan aprisionado, que tenta domesticar à espadeirada dum racionalismo positivista. Mas os mitos são friáveis, resistentes, movediços e pouco utilitários. O que neles parece nunca é, e a realidade é o que menos parece.
Este filme, em que o Depp é Don Juan e o Brando é psiquiatra, é uma fita divertida e interessantíssima, sempre a saltar da ironia da paródia para o discurso da seriedade. E ambos acabam a inverter os seus papéis: Don Juan, cujo carácter tem traços de delírio com intromissões edipianas, sai do mito para não ficar internado no hospital psiquiátrico, condenado aos químicos e à loucura. E o psiquiatra reformado entra no mito enquanto Don António de Flores, à beirinha do delírio.
Boa era a ataraxia do Ricardo Reis, que via distanciado as Lídias e as Neeras e se limitava ao espectáculo do mundo, contente quase e bebedor tranquilo. Mas esse só tinha vida real dentro dum papel impresso.