domingo, 6 de abril de 2014

O último maçaricão-esquimó 29

(...)
             Tinham-se mantido silenciosos durante todo o dia, já que o voo a tão grande altitude reclamava toda a energia de que dispusessem. Mas agora, ao conduzir a fêmea descendo a pique entre paredes de nuvens, o maçaricão gritava, excitado. O poço atmosférico alargou-se e o ar assobiava à sua volta. Voavam em glissagens laterais, para reduzir a velocidade de descida. A princípio o ar era tão rarefeito que não podiam travar com as asas. Quase não tinham controlo sobre si próprios, e despenhavam-se de encontro ao solo. Mas o ar foi-se tornando mais denso, forneceu resistência às asas, e começaram a descer mais lentamente. A pressão crescia rapidamente e causava-lhes dores nos ouvidos. Depois de passarem a camada de nuvens, nivelaram o voo e dirigiram-se para o Pacífico, que viam no horizonte, como leve linha azul.
            Em dois ou três minutos tinham chegado com uma rapidez dramática a regiões muito diferentes do ermo gelado e luminoso de há pouco. Voavam ainda tão alto que só podiam distinguir contornos difusos. Muito embora, a terra era de novo sua. Lá em baixo havia solo e pedras e plantas, não já o nada aéreo das nuvens. Mas aqui o céu era opaco, não havia sol nem qualquer luz brilhava, na atmosfera quente. E o ar sentia-se novamente. Tinha de novo substância, dava às asas força e impulso e enchia os pulmões, sem que, ao expirar, eles sofressem de dolorosa dispneia.
            Sem perder tempo continuaram em frente, seguindo o terreno que caía a pique. E poisaram, já tarde avançada, numa estreita faixa de praia, à beira do Pacífico. Durante alguns minutos beberam sofregamente água salgada. Depois comeram, até escurecer.
            Ao crepúsculo clareou um pouco. E os grandes cones vulcânicos dos Andes desenhavam-se cruamente a Leste, ganhando um ímpeto e uma força aterradores. Todos os anos o instinto do maçaricão o conduzia sobre esta poderosa barreira de calcário, de tempestades e neve. E todos os anos lançava um olhar para trás, antes que a lembrança se lhe apagasse. Por mais lento de raciocínio que o seu cérebro fosse, ficava sempre espantado com a resistência das asas. 

O CORREDOR DA MORTE
           
            A comissão de protecção das aves receia que tenham de ser colocadas na lista dos animais ameaçados de extinção as seguintes espécies: o condor californiano (em 1939 já não existiam sequer 50 exemplares), o bico-de-marfim (são conhecidas menos de 30 aves), o maçaricão-esquimó (efectivo desconhecido, caso ainda exista)...
            Não temos disponível nenhuma outra informação sobre o maçaricão-esquimó. É perfeitamente possível que esta ave esteja extinta. Mas os relatos esporádicos de que dispomos, relativos aos últimos dez anos, deixam a esperança de que ele tenha sido casualmente avistado por alguns observadores. Apesar disso parece-nos aconselhável que a Liga Americana de Ornitólogos estabeleça ligação, quer na Argentina quer noutras repúblicas sul-americanas, com organizações ou pessoas individuais que estejam em condições de efectuar novas pesquisas. No caso de serem detectados maçaricões-esquimós que passam o Inverno na Argentina, poderiam ser tomadas medidas que lhes garantam uma melhor protecção, seja através da direcção do Parque Nacional Argentino, seja de qualquer outro modo...