sábado, 1 de julho de 2017

Formalistas

O papel do formalismo na revolução de 1917
Enquanto os bolcheviques faziam a
revolução, os formalistas russos contavam
sílabas aos versos e procuravam
o narrador nos romances do século
dezanove. Não sei se as sílabas assobiavam
como as balas na rua, ou se o narrador
subia à tribuna do capítulo para gritar
a estranheza que, segundo os formalistas,
distinguia o discurso literário do outro. Então,
gritavam os revolucionários, há uma
distinção de classe entre o romance
e o mundo? Nós, que somos reais, e andamos
aqui aos tiros para nos libertarmos
da reacção, não passamos de criaturas
banais ao lado desses heróis narrativos
que só são diferentes porque nasceram
da cabeça dum escritor? Vamos mas é
pôr ordem nisto: nada de separar
literatura e revolução. Está
bem, disseram os formalistas. Vamos escrever
com fogo, pólvora, baionetas - fuzilando
a métrica, decapitando a estrofe, cortando
o narrador da sua realidade concreta. E deram
o argumento final ao citar assim Shakespeare
quando falou em "palavras, palavras, palavras",
contra os que só usavam a retórica, ignorando
a realidade. E concluíram: "Se em vez disso
tivesse dito "batatas, batatas, batatas", não teria
morto a fome a ninguém. O argumento
não convenceu os inimigos do formalismo,
e a revolução continuou, com uns a morrerem
por falta de batatas e outros a serem mortos
por se recusarem a engolir as palavras."