A nossa triste história está escrita. Nós é que não queremos lê-la!
" (...) Os homens moviam-se sem necessidade de ordens, os transmissões montavam os rádios, os condutores preparavam os guinchos de reboque, os enfermeiros tentavam retirar os corpos do interior da torre blindada.
Puxaram o corpo meio esmagado do furriel do esquadrão de cavalaria a escorrer sangue e espuma da boca, desceram-no desarticulado da velha lata para os braços do Bento que pegou nele ao colo como a um menino, a cara de criança em corpo de gigante a enfrentar do outro a face branca da morte, sem acreditar que já não estivesse vivo, deitou-o docemente à sombra dum arbusto compondo-lhe os membros, voltou pelo mesmo caminho na sua passada de urso cansado com a espingarda, que parecia um brinquedo, pendurada às costas, à espera de o mandarem fazer mais algum serviço.
- O apontador da metralhadora também está morto, esmagado pela torre que saiu dos encaixes. O condutor é que não sei, não se pode passar para o seu lugar - explicou um dos que tentava enfiar-se dentro da Fox. - Pelo menos os pés devem estar desfeitos.
- Para já é preciso tirar do buraco esse caixão com rodas! (...)
O pequeno alentejano passou por cima dos restos de carne em massa e do sangue fresco misturado com óleo engolindo os vómitos, agachou-se para não bater com a cabeça nos ferros amolgados, espremeu-se contra os restos do metralhador e do furriel (...)."
- Penduraram, veja só, um garrafão de vinho vazio na mão da estátua do Camões que se encontra na marginal lendo os Lusíadas virado para a Índia, e colocaram um chapéu de palha roto na cabeça do Infante D. Henrique, que está no Largo da Alfândega! Eu, como autoridade administrativa venho exigir em nome do povo da cidade (...)".