domingo, 29 de dezembro de 2013

Austeridade - A história duma ideia perigosa (Mark Blyth)


[Fig 2.3 Dívida governamental antes e depois da crise de 2006/2012. Fonte OCDE]
«(...) Espero que isto demonstre que qualquer narrativa que localize a despesa esbanjadora dos governos antes da crise de 2007 como causa da crise é mais do que um simples erro: é malícia e facciosismo.
De facto, a dívida média dos países da OCDE antes da crise estava a descer e não a subir. O que aconteceu foi que os bancos prometeram crescimento mas deram prejuízos, e transferiram o custo para o Estado, que depois ficou com a culpa de gerar a dívida, e desde logo a crise, coisa que, é claro, tem que ser paga com cortes na despesa. Os bancos podem ter tido prejuízos, mas os cidadãos pagá-los-ão. Este é um modelo que vemos repetir-se na crise. (...)
Uma forma simples de ver a decisão de resgatar os bancos dos EUA em vez de os deixar falir é considerar que há 311 milhões de pessoas nos EUA. Dessas, 64% tem 16 anos ou mais; cerca de 158 milhões de pessoas trabalham. 72% da população trabalhadora vive do salário. Tanto quanto se pode afirmar, há cerca de 70 milhões de revólveres nos EUA. Então que aconteceria se não houvesse dinheiro nos ATM e os salários não fossem pagos? Era esse o medo. (...)
No 3º trimestre de 2008, o auge da crise, os seis bancos de topo dos EUA , Goldman Sachs, J.P.Morgan, Bank of America, Morgan Stanley, Citigroup e Wells Fargo tinham, no seu conjunto, um quociente de activos, em relação ao PIB, de 61,61%. Tinham quocientes de alavancagem que chegavam a 27 para 1, ou eram tão baixos como 10 para 1. Compare isto com o que se passava no Lehman Brothers. O Lehman tinha uma alavancagem de 31 para 1, numa base de activos de 503,54 milhares de milhões de dólares, que é o equivalente a cerca de 3,5% do PIB dos EUA. Se isto não era suficiente para o governo dos EUA deitar logo mãos à obra para impedir que o contágio se disseminasse através dos mercados de CDS e de repo, a possibilidade de lançar mais 60% do PIB para a fogueira, o total de activos do conjunto dos bancos, concentraria certamente a mente colectiva no problema do demasiado grande para falir. Portanto os bancos foram resgatados e os custos, como vimos, foram suportados, primeiro pelo Estado, e em última instância pelo contribuinte. (...)
A crise começou na América, porque este sistema tinha-se tornado demasiado grande para falir. (...)