Viseu foi há tempos considerada a melhor cidadezinha para viver. E tem um centro de camionagem que é uma construção recente. São múltiplos cais de embarque debaixo dum telheiro, à volta dum descampado, e corre neles um vento que chega da Sibéria. É improvável sobreviver nos bancos de madeira, encostados à parede.
O interior do rés-do-chão está vazio. Rodeado de guichés que ninguém usa, em todo o átrio não há um único banco. Mas lá fora, lá ao fundo, existe um elevador, um monta-cargas de ferro que já transportou gado, e sobe ao 1º andar.
No piso superior há um café, e uma banca de jornais, e guichés de empresas de camionagem de portinholas corridas. O ambiente é limpo e mais ameno. Mas dos bancos corridos que ali estão não se podem controlar os autocarros que chegam, e se dirigem à Guarda, e a Lisboa, a Coimbra, à Covilhã, a Bragança, a Vila Real... Ou à Espanha, à Suíça, ao Luxemburgo...
Tiro as luvas, tomo notas, já me gelaram os dedos. Sinto que estou na Ucrânia, num arrabalde qualquer do pólo norte, quem sabe se não cheguei ao Ushuaia. Dois jovens dedilham smartphones, e há mulheres de ancas redondas que passeiam para ludibriar os pés.
Eu volto a calçar as luvas e arrasto por ali o carrinho das rodas, e mando para o caralho as elites que aí andam, e os autarcas dinossauros que nos têm governado, e os ministros todos desta penúria austera, e os gestores da coisa pública, e os arquitectos que riscaram estes planos. Desço no monta-cargas do gado e volto outra vez ao frio, não me aconteça perder o autocarro. Que já chegou e reserva algum calor.
Lá fora estão quatro graus, porém os Lampiões estão a ganhar.