Terá sido depois de 1956, o ano do sobressalto húngaro contra o stalinismo. O Pavelca apareceu na aldeia trazido pelo padre, que o recebeu enviado por alguém.
Era ruivo, de cabelos cor de linho, e uma pele muito branca que o nosso sol ibérico mordia. E depressa se integrou em jogos e brincadeiras.
Um dia metemo-nos num palhal e devorámos duas latas de corned-beef, dessas que vinham das fábricas de Chicago pela mão da Caritas. O padre distribuía sacos de farinha, leite em pó e queijo que era de plástico. E cigarros que vinham do Kentucky, enrolados numa cinta, os mata-ratos que os velhos fumavam pelos caminhos.
O sobrinho do padre, um belo judeu errante, trazia no bolso um rolo de mata-ratos. E nós fumámo-lo todo, na penumbra do palhal, não sei bem como chegámos ao fim.
Um dia o Pavelca foi-se embora sem aviso, demos pela falta dele. Levaram-no para Lisboa, terá partido para a América, uma terra que era a da promissão. Hoje ninguém o recorda, talvez o Trump seja um descendente dele, arraçado de sioux. É questão a esmiuçar.