Os figos aqui na Lapa são acidentais, um mimo doce ao canto duma horta, quando muito. São frias, as terras, e a geografia é sempre determinante. Por isso os figos vinham da terra quente, uns quilómetros para lá daqueles montes: os figos, o vinho e o azeite. E pelo Verão fora, andava numa fona a colheita das batatas, passavam sempre os figueiros. Deixavam figos a sério e levavam nos burricos as batatas que não tinham.
Nos invernos de há cem anos, uma casa daquelas não podia dispensar os figos secos, o único e fácil modo de lhes conservar algumas qualidades. Por isso a recolha deles era uma trabalheira. Secavam-se em grande escala, num sequeiro, e às vezes passavam pelo forno, depois de cozido o pão.
Lá íamos nós à vinha da Volta Larga, a cavalo na Marquesa, com a minha mãe atrás. Passávamos aos Crespos, ao Safrial, às Águas-Vivas, ao Ribeiro de Pau... ao atalho do Cruzeiro para escaparmos aos loquazes encontros do meio-do-povo. Mais um pouco e já lá estávamos. Depois era só encher os dois cestos vindimos, que a Marquesa a duras penas haveria de carregar.
Um dia encarrapitei-me num ramo duma figueira. Partiu ele e eu caí desamparado, e lá fiquei um bocado, entontecido e sonâmbulo. Foram por água ao poço dum vizinho, um que estava debaixo duma amoreira onde muitas vezes pintálgávamos bochechas e camisas.
O quebranto lá passou, ai Deus louvado. E o pior coube à Marquesa, que teve que me trazer às cavalitas.