terça-feira, 24 de janeiro de 2017

Há muito mais marés que marinheiros!

«Depois duma noite de arrebatada invernia, de temporal desfeito, palavras estas que já nasceram emparelhadas, as primeiras não tanto, e umas e outras tão pertinentes à circunstância que forram o trabalho de pensar em novas criações, bem poderia a manhã ter despontado resplandecente de sol, com muito azul no céu e joviais revoadas de pombos. Não estiveram para aí virados os meteoros, as gaivotas continuam a sobrevoar a cidade, o rio não é de fiar, os pombos mal se atrevem. Chove, suportavelmente para quem desceu à rua de gabardina e guarda-chuva, e o vento, em comparação com os excessos da madrugada, é uma carícia na face. Ricardo Reis saiu cedo do hotel, foi ao Banco Comercial cambiar algum do seu dinheiro pelos escudos da pátria, pagaram-lhe por cada libra cento e dez mil réis, pena não serem elas de ouro que se trocariam quase em dobro (...). Lembra-se de ali se ter sentado em outros tempos, tão distantes que pode duvidar se os viveu ele mesmo, Ou alguém por mim, talvez com igual rosto e nome, mas outro.(...)»

Saramago cultiva neste romance muita digressão, reflexão e retórica discursiva. Haverá quem aprecie. 
Sobram-me do Nobel, e bastam-me, o Levantado do Chão, o Memorial do Convento, o Ensaio sobre a Cegueira e a Viagem a Portugal, que são, (foram!), um espanto. Para o resto falta-me o tempo.