(Cont.)
As incansáveis asas bateram-lhe mais depressa. O ar comprimiu-se fortemente contra o seu corpo aerodinâmico. O turbilhão do bando invisível foi-se tornando maior, e era de facto mais forte do que todos os outros que encontrara nessa noite. A sua impaciência cresceu. Uma leve esperança, meio reacção instintiva e meio vago pensamento consciente, agitou-se-lhe no cérebro. Estava iminente o fim desta interminável procura de companheiros da espécie? O maçaricão aumentou a velocidade, até lhe doerem os poderosos tendões do peito, um dos tecidos mais fortes em todo o reino animal.
As incansáveis asas bateram-lhe mais depressa. O ar comprimiu-se fortemente contra o seu corpo aerodinâmico. O turbilhão do bando invisível foi-se tornando maior, e era de facto mais forte do que todos os outros que encontrara nessa noite. A sua impaciência cresceu. Uma leve esperança, meio reacção instintiva e meio vago pensamento consciente, agitou-se-lhe no cérebro. Estava iminente o fim desta interminável procura de companheiros da espécie? O maçaricão aumentou a velocidade, até lhe doerem os poderosos tendões do peito, um dos tecidos mais fortes em todo o reino animal.
Aproximou-se
do bando. Na escuridão, só agora iam tomando forma as aves que o precediam,
primeiro vaga, depois mais claramente. Durante um bom minuto o maçaricão apenas
pôde reconhecer a linha desvanecida da sua formação, mas agora via claramente
cada uma das aves. Só voadores fortes e rápidos, como os gansos, os maçaricões
e as tarambolas-douradas voavam assim, nesta formação em coluna, em diagonal ou
em cunha. Através dela, cada ave tirava partido do turbilhão da ponta da asa da
ave precedente, sem que fosse perturbada pela esteira de turbulência que ela
deixava atrás. E o maçaricão sabia que os gansos ainda não voavam para Sul.
Ficou ainda mais impaciente, voou ainda mais depressa.
A
distância diminuiu rapidamente, e as aves que o precediam tomaram forma nítida.
Eram pequenas, muito mais pequenas do que ele. Mas agora já não sentia a
rejeição instintiva que o levara a não dar qualquer atenção aos
maçaricões-norte-americanos ou às narcejas. Continuava a sentir o mesmo impulso
de se juntar a um bando. Soltou um grito de chamamento discreto,
responderam-lhe tarambolas-douradas.
Tratava-se
de um grupo de quarenta ou cinquenta aves, e o maçaricão alinhou na parte de
trás da cunha. Reduziu a velocidade e anunciou a sua presença com uma série de
gorjeios rápidos. Todo o bando respondeu em uníssono com trinados fortes. O
ímpeto do maçaricão ficou silenciado. No mais fundo de si agitava-se ainda um
indefinido sentimento de solidão, mas a partir de agora já não voava sozinho.
De entre
as mais de trinta espécies de narcejas que todos os outonos migram do Árctico
canadiano para o Sul, apenas a tarambola-dourada é um companheiro de viagem
adequado para o maçaricão-esquimó. Ambos têm velocidades de voo semelhantes e
apreciam idêntico alimento. Mas há ainda outra razão mais importante. As
tarambolas e os maçaricões são voadores particularmente resistentes, e rejeitam
a rota terrestre sobre a América do Norte, que todas as outras aves de
arribação adoptam. Em vez disso dirigem-se para leste, até às costas rochosas do
Lavrador, da Terra Nova e da Nova Escócia, e daí voam directamente para Sul,
sobre o Atlântico. Vencem esta etapa de 4 mil quilómetros ou mais, num
esgotante voo de quarenta e oito horas sem escala. Não fazem qualquer paragem
até alcançarem terra, na costa norte da América do Sul.
Muitas
vezes junta-se às tarambolas-douradas um grande fuselo americano, e ocasionalmente
acompanham-nas outras narcejas, na longa rota do Atlântico. Esta rota é de
facto um encurtamento, mas só o maçaricão-esquimó e a tarambola-dourada a
percorrem regularmente todos os outonos. Entre as aves do Árctico, só eles
possuem a força e a velocidade de voo indispensáveis para fugir ou enfrentar as
tempestades do alto mar, que não são raras. Além disso, graças a esta rota,
elas podem usufruir dos arandos escuros que amadurecem no Outono, e crescem
abundantemente nas encostas e nos planaltos do Lavrador. As aves que migram
sobre o continente privam-se destas reservas de alimento. Ao contrário, na
primavera, as tarambolas e os maçaricões têm que seguir a rota habitual sobre
as planícies do Oeste, pois nessa altura os arandos estão endurecidos e mortos,
debaixo da neve. No Lavrador ainda domina o inverno, quando o Árctico se cobre já
dos verdores da Primavera.
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