O milhafre e o pintassilgo
Vejam como - disse um dia o milhafre -
com a agudeza da minha vista, a rapidez
do meu voo, o poder das minhas garras,
desordeno facilmente o corpo breve
das pequenas aves.
Não são de admirar - continuou -
a sabedoria e a bondade do grande arquitecto,
que assim me arquitectou
tão excelentemente
para a excelente tarefa de matar?
Sabedoria talvez - respondeu o pintassilgo,
debatendo-se nas garras do milhafre -
bondade, nem por isso.
Enfim, há sempre quem seja do contra -
suspirou o milhafre, enquanto dissecava
com o bisturi do bico as carnes do herege.
[Gaveta do fundo, Tinta-da-China]