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Em
Junho a noite do Árctico é muito curta, pouco mais que um intermezzo de
penumbra. Durante os longos dias, nuvens de mosquitos enxameiam das valas
profundas, como cortinas de fumo, sob o degelo da tundra.
Antigamente,
nesta época do ano, as populações esquimós aguardavam aqui o doce, fremente e
longo trinado dos maçaricos-esquimós. Eles regressavam ao Árctico em grande
número, trazendo consigo a perspectiva de carne tenra. Mas os grandes bandos já
não aparecem. A própria lembrança deles se perdeu, ficando apenas a lenda. Pois
o maçarico-esquimó, primitivamente uma das mais abundantes aves de caça da
América do Norte, deixava atrás de si, na Primavera e no Outono, um verdadeiro
corredor da morte. Voavam tiros de todos os lados, e ele foi demasiado lento a
aprender o que era essencial à sobrevivência: o medo, diante da espingarda do
caçador.
É
verdade que a espécie se manteve, mas encontra-se em perigo extremo de
extinção. Tal como antes, os poucos maçaricos-esquimós que ainda existem
continuam a fazer a sua longa e perigosa migração, desde a Patagónia argentina
onde passam o Inverno, até às planuras húmidas da tundra que descem para o mar
polar. Aqui procuram a sua fêmea. Mas o Árctico é imenso, e, as mais das vezes,
a sua busca é vã. Agora voam sozinhos, os últimos representantes de uma espécie
moribunda.
Quando
clareou a penumbra da noite sobre o Árctico e mais um dia de Junho começou,
primeiro com um vermelho pálido e depois um amarelo vivo, o maçarico reconheceu
finalmente, mil metros lá em baixo, a familiar curva do rio debruada de gelo. Nessa
noite voara oitocentos quilómetros através da tundra plana e uniforme, sobre
muitas curvas de rios que podiam confundir-se com esta. Sentia-se esgotado mas sabia
que só agora estava em casa. Tinha as pontas castanhas das rémiges e das
tectrizes em desalinho, após uma viagem migratória que começara abaixo dos trópicos
e terminara sobre estas planuras escalvadas, num voo ininterrupto. O instinto
do acasalamento rugia nele.
O
maçarico abriu as asas e deixou-se cair em glissagens laterais. Pedaços de gelo
rosados, a flutuar no rio acastanhado, aproximavam-se vertiginosamente. Então interrompeu
a picada e desceu em voo planado até ao chão. Pousou na margem lamacenta dum
charco de esmalte, um pouco afastado do rio.
Os
maçaricos chegam aqui em Junho, desde há milénios, para defender a reserva e os
seus locais de nidificação. Na tundra desolada aguardam febrilmente as fêmeas,
esperando que elas procurem aqui um companheiro para este ano. E, durante o
tempo de espera, mal conseguem aliviar o instinto de acasalamento nas lutas com
os vizinhos, pela defesa da reserva que escolheram.