Na nossa vida há anjos protectores, disfarçados de gente. Trazem-nos o mimo que os deuses nos negaram, por serem caprichosos. Muitas vezes têm vidas que nem parecem de gente. Mas foram-no, e deixam-nos lições e proveitos.
No tempo dela, se era Inverno, saía cedo de casa mais umas colegas, para os olivais da terra quente. Sendo Verão, iam apanhar garrobas para as colinas de Foz-Côa, uma lonjura. Ainda não havia as farinhas que há hoje, e os muitos gados chamavam-lhe um figo. Por lá ficavam semanas até voltarem a casa.
Bebiam água dos charcos, apanhavam sezões, e quando calhava regressavam a casa.
Os Crespos do Vitorino levaram-na de criada. E quando o velho Zé Ribeiro se sentiu enganado pelo pessoal que lá tinha, puseram-no na rua. Foi assim que a Adelaide e a filha mais velha vieram para esta casa. A filha já era a feitora, embora nova. Por isso os Crespos não hesitaram. Livraram-se do feitor que lá tinham e meteram-na a ela.
Foi só através do casamento que o marrafinha lá entrou, vindo Matosinhos. Doutro modo nem pensar.
Adelaide morreu na década de sessenta, ninguém hoje sabe já de quê, andavam os netos a fazer pela vida em longes terras. Porque o mundo nunca foi doutra maneira.