Quando foram expulsos de Hervaz, pelos Reis Católicos, os judeus vieram parar aqui. Ninguém sabe explicar como, mas vieram. Então era isto era um formigueiro e as pedras ainda estão carregadas de sinais dos sefarditas.
Hoje sobrevivem no lugar meia dúzia de cristãos: o Alfredo, tímido como um lagarto, filho tardio do João Milagre, que já morreu há muito; a Guilhermina, viúva do Aníbal, que o alzheimer foi encurralar na horta das Fragas e morreu; o Zé Pequeno, que os pretos não vindimaram na Angónia; a Dulce, que lá ficou sem o César, e que o filho levou para morrer em Viseu; a criada que foi do Rato Branco, esse que privatizou a água do valado para lavar os copos na taberna; os filhos do Benjamim, da Austrália, da Europa, se cá vêm...
O povoado está deserto e abandonado a fantasmas. Lá vai morrendo aos poucos, até desaparecer, que o tempo já é muito e nem chaminés fumegam. Os valados de seca dos paúis, do Ribeiro de Pau ao Safrial, voltaram à selva antiga dos salgueiros, desse tempo dos reis povoadores.
É uma história muito longa, sem um rumo, um sentido e um destino. Num mundo que enlouqueceu de modernidade e perdeu as raízes.