domingo, 18 de setembro de 2011

Fomos ao rio de Meca - 4

(...)
A coluna chega, no meio do pó, da algazarra da criançada, estaciona ao longo da picada, em fila comprida a perder-se de vista. Os motoristas vêm encalorados e sujos, molhadas de suor as camisas e as peles gordas e vermelhas. Os soldados arrastam-se até ao quartel, fazem a continência ao administrador de posto. Chegam os polícias, os brancos avançam apertos de mão, dão abraços aos conhecidos.
As mulheres saíram das cubatas, atraídas pelo burburinho. Trazem os monas encavalitados nas ancas, um ar desajeitado e humilde nas caras, uma curiosidade indisfarçada nos olhares.
O tempo é curto, sôr Antunes grita alto, chamando os homens. Dá uma volta rápida de olhar nos sacos amontoados. Põe a mão no queixo, faz uma pausa como quem bota contas, volta-se para os vendedores e oferece quatro escudos e meio pelo café.
Os homens olham-se, aflitos, negro Paulino tem razão.
- Num pode, patrão!
O soba, receoso, adianta-se para sôr Antunes. Explica que os homens não podem vender o café por menos de oito angolares.
- É preço justo! Patrão pode vender em Luanda por vinte escudos à vontade!
Sôr Antunes volta costas, casquina uma gargalhada, no meio do gesticular teatral dos braços. Encaminha-se, lento, para os polícias que sorriem.
- Já viu, sô chefe? Gente maluca! Querem oito escudos pelo café!
Na sombra das mangueiras os homens falam conversas baixas. Se não houver combinação no preço, o café não se vende… Não vai haver cervejas frescas na garganta, nem panos garridos nas mulheres, os monangambas não vão puxar mesmo o toldo dos camiões… Um deles adianta que se tire um angolar no preço. Negro Paulino opõe-se. Irado.
Vem o chefe dos polícias, balançando o corpo. Ao lado sôr Antunes, sorridente, seguro nos dotes de persuasão do medianeiro.
- Então o pessoal perdeu a cabeça, hã?! Vocês querem arruinar o sôr Antunes, ou quê?!
O sô chefe chega-se mais aos homens, amigável, lá no linguajar deles. Propôe-se convencer sôr Antunes a pagar cinco escudos e meio. Que já era um bom preço, e que os camiões não podiam ficar ali à espera, o dia todo.
Os homens hesitavam. Confusos. A pontos de ceder. Mas Negro Paulino adiantou-se.
- Sô chefe, a gente não quer ruinar sôr Antunes! A gente não quer maka. Oito angolares é o preço justo no café. A gente toda combinou por menos dinheiro o café não vai nesse camião que está aí!
Negro Paulino falou agressivo.
(...)