sábado, 24 de janeiro de 2009

O insustentável peso da vida

Festeja esta família a Consoada numa cozinha rural, daquelas de pedra antiga. Reunidas em volta da lareira, que parece arder há séculos, estão quatro gerações. O bisavô hiberna no escano, amparado na almofada, ninguém sabe se ainda ouve, se ainda sente, se ainda vive. Traz uma pilha ligada ao coração.
Um bisneto grasna por ali, admirado com as paredes escuras, estranhando as vitualhas. E das quatro gerações apenas uma tem idade activa.
Este almoço de Natal é na cidade e não tem lareira acesa. A bisavó, alheada, repousa num canapé, o volumoso ventre enfaixado em ligaduras, da operação que há dias flhe fizeram, a ver se escapa a uma coisa ruim.
A bisneta remexe a papelada que restou das prendas do Pai Natal, na esperança de encontrar mais um embrulho que sobejou por abrir. E das quatro gerações, apenas uma tem idade activa.
Dá nisto, a imortalidade. Neste mundo em que vivemos, quando a morte vai de folga, é insustentável o peso que a vida ganha.