quinta-feira, 1 de setembro de 2011

Manuel Laranjeira - Cont. 2

[Laranjeira, médico em Espinho, suicidou-se em 1912]

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"A verdade é que, na sociedade portuguesa, a noção da sua personalidade colectiva, o sentimento de vida nacional, o sentimento de pátria, se quiserem, não existe sobrepondo-se a todos os outros sentimentos de interesse individual. Existe apenas o sentimento e o espírito intolerante de seita, existe apenas o interesse da quadrilha, mascarados por um messianismo avariado, de ínfima qualidade.
Um dos aspectos mais típicos da vida portuguesa, e um dos seus males mais funestos, é a sua prodigiosa fertilidade messiânica. A cada passo surge um homem que se sente com envergadura e ventre de messias. Por cada messias que aborta, pululam inesgotavelmente centenas de messias, toda uma falperra de messias. E enquanto a Nação rola à aventura de messianismo em messianismo*, a sociedade portuguesa, lentamente, infatigavelmente, vai-se dissolvendo e desagregando.
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A palavra escrita é imprescindível para a vida social moderna. Actualmente ela é o instrumento usual mais importante da sociabilidade. Na complexidade da vida de hoje, o homem que não sabe ler nem escrever é um homem incompleto, desarmado para a luta do pão quotidiano. É nestas lastimosas condições de inferioridade social que se encontra a maioria da população portuguesa.Incapaz de transmitir ideias e sentimentos, o cérebro da grande massa da sociedade portuguesa definha-se, atrofia-se, lenhifica-se, e a alma portuguesa estagna na tranquilidade das águas paludosas. Acrescente-se a esta lenta agonia do espírito nacional a influência corrupta e secular da educação jesuítica, sinistra e deprimente, e a única coisa que espanta verdadeiramente é a pasmosa resistência deste desgraçado povo que tudo tem sofrido, e que ainda não sucumbiu totalmente ao peso do seu mau destino."

[*faltou especificar aqui que o primeiro data de 1415. Mas não se pode ter tudo!]