sexta-feira, 26 de junho de 2009

Trovas Novas

Cavaco é infatigável, onde chega, a propagar a fé e a esperança. Só faz bem, embora falhe na caridade connosco!
Já lançou mão de Santo Álvares Pereira e do rei Afonso Henriques, modelos que recomenda. E quando foi a Trancoso, para uma inauguração, logo se atirou às Trovas do Bandarra, que é farmacopeia antiga.
Diz assim a profecia: Portugal, com a sua virtude e determinação, será capaz de vencer as dificuldades do país!
Como trova não é lá grande coisa, o mais certo é ser apócrifa. Já rigorosamente igual e genuína é a febre visionária que nos governa há séculos. Com a história, em resultados, a manter-se reticente.

quinta-feira, 25 de junho de 2009

Filho pródigo

Manuel Dias Loureiro, cavalheiro de indústria do infausto BPN, ex-ministro das polícias de Cavaco Silva, ex-conselheiro de Estado de nomeação presidencial, regressou a Aguiar da Beira no dia de Portugal, e acabou aclamado como o filho da terra mais dilecto. Tão dilecto e humanista que nem se esquece do povo, quando se trata de jogos de sueca e chincalhão.
Lembra a parábola do filho pródigo, não mete o melhor bezerro mas é pior. É um Portugal patético às cegas no nevoeiro. No seu mais trágico. No mais irremediável.

segunda-feira, 22 de junho de 2009

Agapantos

São lilases ou brancos, os agapantos. E hibernam todo o ano, a dormir nos canteiros. Quem sabe se a guardá-los da canzoada doméstica, tão lesta a alçar neles a libertina perna.
Na primavera levantam o mastro, inquietos como antigas caravelas. E festejam o solstício de gávea engalanada.
Caules altivos, a pendular na brisa, têm um quê de manguitos das Caldas. Que os agapantos fazem, aos cachorros que passam.

sábado, 20 de junho de 2009

Quando a esmola é muita...

A EDP tem andado por aí a fazer juras de amor às lontras, a prometer aos grifos a bem-aventurança, e a garantir o céu aos abutres do egipto, às águias de bonelli e à família restante.
É sabido que a energia é um problema premente para uma família qualquer. Mas cada barragem é um compromisso, entre o que nela se perde e com ela se ganha.
Não sei o que pensam disto os falcões peregrinos. Porém, se atentarem no provérbio, melhor lhes fará desconfiarem, sendo pobres. Já que o pregão das boas intenções quer apenas fazer-nos aceitar o crime de lesa-património da barragem do Tua.

segunda-feira, 8 de junho de 2009

2ª Reflexão depois das reflexões

Quando Miguel de Unamuno visitou Portugal, há um ror de anos, deixou dito serem os portugueses um povo de suicidas. E eu sempre vi na expressão um excesso retórico.
A atribulada brisa desta noite veio desfazer-me as dúvidas. O velho não usou metáfora nenhuma. Disse o que viu, simplesmente.

domingo, 7 de junho de 2009

1ª Reflexão depois das reflexões

Na brisa agitada desta noite, chega uma boa notícia: o aeroporto novo de Alcochete não vai passar do projecto; e o TGV terá muito que suar, para chegar ao Porto e a Braga. Haja Deus!
Tudo o resto são paixões voláteis, e gritos de multidão.

sábado, 6 de junho de 2009

Reflexões em dia de reflexão - V

5 - O PRESIDENTE
Cavaco Silva tem famas de impoluto, e também terá proveitos, o que é um bem muito escasso nos tempos que vão correndo. Mormente no ventre do cavaquismo, esse alfobre de figuras de cuja ética se sabe tão pouco, não mais que o suficiente para ocuparem as bocas do mundo. Ao que parece, foi um regabofe.
O Presidente tem alimentado pacientemente os mitos fantásticos da sua governação, e dos tempos heróicos do sucesso, em que o país era o bom aluno da Europa. Esperando que a falta de memória nos faça esquecer a todos, que é nos erros e ilusões dos seus governos que foi criando raízes o desespero presente. E tem tentado passar sem se molhar, pela enxurrada que se abateu sobre os seus émulos e serventuários. Mas há questões pouco claras.
Cavaco Silva teve necessidade de esclarecer há meses que nunca foi accionista do BPN. Apenas lhe confiou a administração de poupanças familiares. Porém não afirmou que nunca fora accionista da SLN, a proprietária do banco.
De facto, em 2001, Cavaco e a família adquiriram 254 mil acções da SLN, ao preço unitário de 1 Euro. Isto no tempo em que a saúde do grupo já não andaria muito católica, pois foi quando Dias Loureiro teve necessidade de ir à supervisão do Banco de Portugal, alegadamente para confidenciar preocupações.
As acções em causa não estavam cotadas em bolsa. A quem foram compradas? Quem efectuou a compra? Onde ficaram sediadas? Como se determinou o preço? Como é que o Presidente as pagou? Por cheque? Em numerário? Por transferência bancária? O pormenor não é despiciendo.
Em 2003, em carta à SLN, Cavaco dá ordem de venda das acções. Não estando elas cotadas em bolsa, sem mais-valias garantidas nem comprador assegurado, por que razão terá decidido vendê-las? Ou foi um palpite amigo, de dentro da SLN, antes que o caldo se entornasse? O facto é que as acções foram compradas pela SLN-valor, a 2,40 Euros por acção. Cavaco obteve em dois anos um lucro que nem na Dona Branca!
Mais tarde Cavaco adquiriu cerca dum milhão de unidades de participação do fundo Multi-manager do BPN, cujo valor entretanto está desaparecido. E declarou recentemente que afinal quem comprou as acções originais foi um banco. Terá sido o BPN? Por que será que o Presidente aceitou tão prontamente a nacionalização do BPN falido?
E o que é que isto tem que ver com as eleições? Pois tem tudo! E ainda mais alguma coisa!

Reflexões em dia de reflexão - IV

4 - OPOSIÇÃO
O PSD, partido principal, é um organismo em coma político. Não tendo mais ideologia do que ocupar o poder, e canibalizá-lo, o que ainda lhe conserva algum halo vital é o exército de autarcas dinossauros, que o atavismo da cidadania indígena vai eternizando nas paróquias.
Retirados os barões dos tempos áureos, reciclados os trânsfugas maoístas, e padecendo da síndrome da orfandade desde que Cavaco o enjeitou, o partido nunca mais exprimiu uma ideia sobre o país, se alguma vez teve alguma. Desapossado por Sócrates dum terreno supostamente seu, dilacerado por guerras intestinas, apresentou um candidato cuja retórica compensa como pode o vazio ideológico, a demagogia oportunista e a ausência de alternativas. Explora algum deslize do governo, e só aguarda que a dureza cáustica dos tempos desgaste Sócrates a seu favor.
Outros partidos não pertencem ao arco do poder, são jogos de circunstância. O axioma não está escrito em bíblia nenhuma, mas está na cabeça dos portugueses. É quanto chega.

Reflexões em dia de reflexão - III

3 - GOVERNO
O governo de Sócrates foi, entre tantos, o único que ensaiou passos concretos, na realização do que era há muito inadiável: algumas reformas estruturais.
Caso inusitado, colocou o défice nos limites do PEC, antes do prazo previsto. E é claro que só pôde fazê-lo, apresentando-se como esquerda a pôr em prática políticas de direita. Sabemos também à custa de quem o fez, mas o homem não é um santo milagreiro. Se o fosse, teria evitado aparecer envolvido em casos de contornos duvidosos, como o Freeport e outros. No fim ver-se-á que são mais as vozes do que as nozes.
A escola pública foi o seu maior erro, por acção. E a justiça, o mais grave, por omissão. É certo que 30% dos professores do básico, não têm qualidade como agentes educativos. É certo que 40% dos professores do secundário, não trazem qualquer benefício às escolas. E é certo que 50% dos professores do superior não têm condições para o ser. É certo ainda que o sistema de ensino padece de décadas de incapacidades, de interesses corporativos instalados, e de equívocos científicos fatais. Mas não se pode reformar o ensino à catanada nos professores, cortando a cabeça à escola e desmoralizando os melhores.
Já na justiça, que é das vergonhas a maior, ainda fez alguns ensaios tímidos. Mas na corporação dos bachareis de leis não é qualquer um que mete o dente. E em breve recuou.
É certo que o erro do aeroporto, e o TGV a Braga e Vigo, não prometem nada de bom. Mas foi a crise financeira soprada da América, em breve transformada em furacão da economia mundial, que veio imprevistamente arruinar-lhe os planos. E nestas condições, só indo a Fátima a pé se pode compor a coisa!

Reflexões em dia de reflexão - II

2 - PORTUGAL
Para Portugal, bem mais que para outros parceiros, a Europa é uma tábua de salvação. Com ironia amarga pode mesmo dizer-se, que é ao mesmo tempo tábua de salvação e ameaça de naufrágio.
As debilidades da economia, a fragilidade energética, o défice educativo, a ineficácia da administração e o estado calamitoso da justiça empurram-nos para a irrelevância, condenam-nos ao arcaísmo ecológico.
Dependemos da Europa para tomar o pequeno-almoço. É por isso que alguns protestos de soberania, e de autonomia nacionalista, são manifestações equívocas de fé, se não de superstição. Pese embora o pedestal em que se sonham as sumidades caseiras, só fazendo o trabalho de casa podemos escapar ao estatuto de reserva de índios.

Reflexões em dia de reflexão - I

1 - EUROPA
Antes de dizer respeito a outros campos da política, esta jornada eleitoral refere-se à Europa, ao Parlamento Europeu.
Diz-se que o projecto europeu vive tempos sombrios. Que existe por baixo dele um défice de ideal, de democracia e de participação dos cidadãos. Que o Tratado de Lisboa é uma ameaça à nossa vida e à nossa soberania. É capaz de ser tudo verdade.
Porém, não foi por isso que as questões da Europa foram mais discutidas. E até vinham a propósito. O que é que a Europa deveria ser? O que é que não deve ser? Qual o contributo que Portugal pode dar, para ela ser o que devia? E afinal ela é o quê? Que políticas deviam ser alteradas? Que poderes faltam ao Parlamento? De que males padece a Comissão? O alargamento já foi longe demais, ou deve ser alargado a mais vizinhos? Deve criar-se (e pagar-se) uma Defesa comum? E uma Diplomacia comum? A deslocalização interna de empresas serve o equilíbrio geral? A resposta da Europa à crise que se instalou é adequada às circunstâncias? Uma Europa a várias velocidades é ou não de aceitar? E que espécie de monstro é esse tal Directório?
Quanto a Europa, ficámos todos na mesma, pois nada disso foi objecto de conversa. Nem sequer de discussão. Muito menos de debate. Por culpa dos partidos concorrentes, claro está. Mas não é igual para todos. E não é que fôssemos agora descobrir a pólvora! Mas ao menos não fazíamos figura de palermas.

quinta-feira, 4 de junho de 2009

Ele a dar-lhe, e a burra a fugir!

O ex-autarca, duma terra que não vem no mapa, foi condenado há dois anos a uma pena de cinco anos e dez meses de prisão, com proibição de exercer cargos públicos durante um período de cinco anos. Por dois crimes de corrupção passiva, um de branqueamento de capitais, um de peculato e um de abuso de poder.
Recorreu para a Relação, e a Relação agravou-lhe a pena para seis anos e meio. Mas jura acreditar na justiça, e sobretudo nos tribunais superiores. Diz ele que o processo que lhe movem é político. A política está a apoiar-se na justiça para se vingar de mim. Mas o primeiro sinal da minha razão será dado pela população nas urnas, e depois pelos tribunais superiores, que têm outra independência. Não tenho dúvidas de que vou vencer as eleições e cumprir o mandato até ao fim. Os factos que me são apontados não são crime.
Vai concorrer às próximas autárquicas como independente. E já anunciou novos recursos para o Supremo, e se for necessário para o Constitucional. A interdição só se torna efectiva com o trânsito em julgado da sentença.
Tudo indica que é mais um daqueles casos em que há problemas do ego, conforme o outro há dias explicou. São muito mais comuns do que parece. E a ser assim, dada a grande falta de memória dos cidadãos eleitores, bem poderá esmerar-se a burra da justiça. É que não foi provado que tivesse recebido qualquer dinheiro. Não encontraram um tostão nas minhas contas.

A Idade de Ouro

Com vénia ao dr. Luís Queirós
Presidente da Marktest e membro da ASPO Portugal

Numa profética palestra, proferida no já longínquo Maio de 1957 mas cuja lucidez ainda hoje impressiona, o contra-almirante Hyman Rickover, considerado o pai do submarino nuclear americano, afirmava o seguinte: “A força muscular de um homem equivale a uma potência contínua de 35 watts. Isto significa que um automóvel se desloca como se fosse puxado por 2000 homens, ao longo da estrada. A força motriz duma locomotiva equivale ao trabalho de 100 000 homens, e um avião a jacto desenvolve a força de 700 000 homens. O mais humilde dos humanos desfruta hoje do trabalho de mais escravos, do que algum dos reis da antiguidade alguma vez possuiu. E apesar das guerras, das revoluções e dos desastres, a nossa época assemelha-se a uma Idade de Ouro”.
A tese da extensa palestra era a de que, no decurso da história da Humanidade, a energia e a sua utilização moldaram a civilização, e o seu controlo esteve sempre associado ao poder. Começando pelo domínio do fogo, tudo passou pelo aproveitamento da energia animal e pela escravatura, em que homens utilizavam a energia de outros homens. Mais tarde foi a energia da pólvora utilizada nas armas de fogo, que antecedeu a era moderna e impulsionou a expansão e a globalização.
Mas foi a descoberta da máquina a vapor e do motor de explosão que criaram condições para o período de maior prosperidade económica, que atravessou todo o século XX. A energia fóssil (carvão, petróleo e gás natural) esteve na base dos fundamentos da nossa civilização, e é responsável pelo conforto das nossas habitações, pela produção dos nossos alimentos, e pela tracção dos transportes que utilizamos. Indústrias como o turismo, ou a construção de grandes infra-estruturas, não teriam sido possíveis sem essa abundância energética. As grandes aglomerações urbanas com os seus arranha-céus são o resultado directo do automóvel a gasolina e do ascensor eléctrico.
Os combustíveis fósseis que hoje se consomem levaram dezenas de milhões de anos a formar. E, para nosso pesar, as palavras de Rickover, proferidas há 50 anos, ainda hoje não podem ser desmentidas: “Se os actuais padrões de vida e o aumento populacional se mantiverem, as reservas de combustíveis fósseis economicamente exploráveis poderão desaparecer algures entre os anos 2000 e 2050; primeiro o petróleo e o gás natural, e depois o carvão”.
Esta relação estreita entre a prosperidade económica e a energia tem sido mal entendida. Os progressos técnicos e a informática têm ajudado a criar a falsa ilusão de que serão encontrados, sem dificuldade, substitutos para os combustíveis fósseis. As exageradas expectativas criadas pelo advento da energia nuclear e pelas energias renováveis serviram para reforçar essa ilusão.
No quadro da actual crise económica, as opiniões dos especialistas convergem na ideia de que a solução consiste na retoma do crescimento da economia. E consideram que só com crescimento se poderá inverter a tendência para o aumento do desemprego. Porém a persistência da crise está a desesperar os economistas, que constatam a resistência às medidas monetaristas: os juros descem e nada parece acontecer; fazem-se injecções maciças de capital no sistema bancário, e o crédito continua parado; os governos nacionalizam bancos e companhias de seguros em dificuldades, e a retoma não aparece.
Pela primeira vez parece estar a ser posta em dúvida a crença nos mecanismos do mercado. E o aumento do investimento público como estimulador da economia, é agora a grande esperança. Existe mesmo uma corrente que advoga que este “new deal” deverá encaminhar-se pela “via verde”, promovendo a eficiência energética, a redução das emissões de CO2 e o investimento nas energias renováveis. Mas também há quem duvide da eficácia desta opção.
Robert Ayres, físico e economista americano que estuda as teorias do crescimento económico, mostrou a estreita correlação entre o crescimento medido pelo PIB e a utilização da energia convertível em trabalho, a que ele chama “exergia”. Ayres explica este conceito lembrando o princípio da conservação da energia: de acordo com este princípio, a energia não se gasta; apenas se transforma e se degrada (o famoso aumento da entropia). Neste sentido, a “exergia” será a energia “boa”, aquela que se pode aproveitar para produzir trabalho. E que é tanto maior, quanto maior for a eficácia desse aproveitamento.
Assim, é na energia, nomeadamente na sua produção e na eficácia da sua utilização, que se deve procurar a chave para a saída da crise actual. Antes que seja tarde.