sexta-feira, 30 de setembro de 2011

Campanha para a história (3)

(...)
E passou então a dedicar-se aos périplos terrestres. Percorria sanzalas, procurava os velhos sobas em busca de algum resquício do poder gentílico esmagado pelo cilindro colonial, discutia com eles aspectos arqueológicos do tratado de Simulambuco. Visitava amigos velhos da Causa, onde quer que algum houvesse, refugiado no bucolismo duma roça de café, e discutia as vantagens oferecidas pela criação das tilápias, na alimentação dos bailundos contratados.
Foi numa dessas excursões que eu tive o prazer de o acompanhar, quando aguardava evacuação para Lisboa após um acidente grave. Por picadas que a memória me não guarda, chegámos a casa dum velho amigo do príncipe, que ali vivia com a mulher e administrava a fazenda. A filha, que também lá estava de férias, frequentava um colégio em Joanesburgo.
E foi pela mão do velho fazendeiro, que trazia espetada no peito a barretina dos meninos da Luz, que me iniciei nos segredos do cafeeiro, nos cuidados que pede e nas ferrugens que o atacam. E que vi pela primeira vez como estava inteligentemente organizado o trabalho na fazenda. Como os contratados dispunham duma ampla camarata onde se amontoavam. Como se construíra uma poderosa torre, com grande quantidade de armamento a distribuir pelo pessoal em caso de algum ataque, não fosse o diabo tecê-las. E como na cantina, ali ao lado, gastavam os pobres os salários, em dívida que se reproduzia como as cabeças da hidra mitológica.
Regressado a Lisboa, já não voltei a Angola. E do príncipe herdeiro dos Braganças não voltei a ter notícias. Não soube dos resultados da sua missão civilizadora, nem sequer se ela cumpriu os planos dos estrategas e mereceu uma medalha de serviços distintos. É que alguns a terão ganho, com menos boa vontade.