domingo, 20 de setembro de 2009

A melhor garfada de Lisboa!

De António Lobo Antunes já cá cantam uma boa dúzia de romances e três livros de crónicas que foram uma pedrada, uma lição, uma epifania, um gosto no momento em que vieram. Chegou depois mais uma boa dúzia que são um labirinto, uma experimentação, um remexer dos lixos quotidianos desta vida.
A literatura portuguesa tem ali um bico-de-obra.
Os encartados da hermenêutica patinam, hesitantes sobre a pertinência da crítica psicanalítica. E na dúvida jogam pelo seguro: paus por baixo!
Os leitores têm cinquenta anos para desfazer as perplexidades, e entretanto o mundo é grande.
O autor cultiva a imagem, e vai subindo a parada. Mas certezas, certezinhas, ninguém tem. Nem ele próprio.
Há, porém, um outro bico-de-obra em Lobo Antunes, que em breve nos vai presentear com 500 páginas de revelações de alma, onde perpassam a guerra, as mulheres, a meninice, a doença, os vícios, o sexo, os traumas, as relações, e mesmo as tendências suicidas. Não consigo imaginar que interesse terá um leitor neste strip-tease. Nem sequer o próprio autor. Mas talvez as suas confidências sobre um colega de ofício guardem a chave do enigma:
Ele começou muito tarde, podia ser meu pai. Ele odeia-me, mas eu não tenho nenhum problema com ele, ele é que os tem comigo. Esta mulher do Saramago - acho esquisito apaixonar-se pelo Saramago por causa de um livro! - e veio a Lisboa de propósito por causa disso. Na altura ainda nos dávamos, e ele "eh pá, o que é que eu faço agora? É uma miúda mais nova do que a minha filha..."
Lembro-me do José Cardoso Pires dizer que o Saramago era o Namora dos anos oitenta, um boom bestial, críticas espantosas, mas lemos aquilo e é uma merda.
Não sei que pessoas lêem o Saramago, se são pessoas mais velhas, o que sei é que quem andava a escrever sobre o Saramago anda agora a escrever sobre mim.

Eu leio, e pasmo, sem entender o que deu a esta gente. Bem sei que a insânia nacional atingiu alturas pouco vistas. Mas não é sem um traço de vergonha que vejo um homem destes - caído agora no colo duma brasileira que pode ser sua neta! - a imitar as figuras dum adolescente patusco.