Era uma vez um rapaz que tinha fama e carreira, e uma voz e uma função e algum proveito. No jornalismo, na crónica, no relato, e na nossa vida de leitores e cidadãos.
Um dia decidiu ser escritor. Não trazia no bornal emoções novas, nem formas inovadoras, nem surpreendentes criatividades, nem os deleites misteriosos que a arte às vezes esconde, nem conteúdos particularmente edificantes, nem lições a melhorar o cânone. Por isso nada de novo acrescentou à paisagem.
Trocou de rótulo na imagem que já tinha, embrulhou o produto num marketing adequado, e ganhou uma respeitável quota de mercado.
Agora está confortavelmente sentado em cima dum milhão de livros vendidos em Portugal. Há-de ser conforto dele, que se contenta com pouco, mas não da literatura ou dos leitores. Porque um tal contentamento assenta numa só realidade e em variados equívocos.
A simples realidade é que o rapaz fez negócio. Quanto aos equívocos, um primeiro é pensar que os sucessos de mercado equivalem a literatura. Um segundo é confundir um escritor com um tipo que vende livros aos milhões. E um terceiro será imaginar que as novas ocupações lhe garantem o lugar e a função que já trazia, na vida dos leitores.
Miguel Sousa Tavares rendeu-se aos falsetes da pós-modernidade, num palco onde já sobravam figurantes. Trocou a boa capa por um mau capelo, o que entre nós é pecha muito antiga. E está no seu pleníssimo direito. Mas quem o lia a sério vai sentir-lhe a falta.
ADENDA: Os críticos literários não me aceitam na confraria dos escritores. Eu vendo muito e eles têm preconceitos contra quem vende muito em Portugal. (MST no PÚBLICO de hoje)
Decididamente, MST não compreende a questão, e isso mete-o num beco sem saída. Nem os críticos (que são pouco de fiar!) podem incensar a qualidade que não há, nem a sua bacoca vaidosice lhes pode tolerar a desconsideração. Resta-lhe, assim, a teoria da conspiração.