Parecerá que desertaram as abelhas e não é verdade. Que as abelhas morrem de tristeza, não desertam.
O Colmeal era um feudo dos Cabrais, ainda vivem as cabras que o atestam. E um dia o dono partiu, à descoberta da Índia. Há quem diga que até se perdeu no mar.
Ficaram os apicultores a fumigar as colmeias...
a riscar pelos caminhos um rasto de humanidade...
a bailaricar no adro, nas festas da padroeira...
e a tocar a concertina, em noites de borga e lua.
Há-de haver 50 anos - 8 de Julho de 57 - os trinetos dos Cabrais reclamaram o domínio. Deram como testemunhas dois desenhos numa pedra.
Um juiz tomou-lhes o depoimento, foi na conversa das cabras, deu cabimento ao pedido. E mandou cumprir a lei.
A guarda veio a cavalo, correu com os apicultores. As abelhas morreram de tristeza e o Colmeal perdeu tudo.
Perdeu apicultores e colmeias, a igreja e os santos dela, o adro e as concertinas.
Acabou mesmo a perder os trinetos dos Cabrais.
E mais tarde veio o tempo, e os incêndios, a tomar conta do resto.
Mas ficara por cumprir um fantasma muito antigo, se não era um remorso dos Cabrais. O facto é que o Colmeal ganhou agora uma estrada, que há séculos lhe fez falta e nunca teve.
É de risco ao meio, a estrada, à maneira da Europa e dos fundos que a pagaram. Mas chega ao Colmeal e ali falece, que para lá do fim do mundo não há destino nenhum.
O largo novo há-de ser calcetado em granito, sempre tem outra nobreza. E acautela as poeiradas, que molestam as abelhas. O mais certo é desenharem nele uma rotunda, pode sempre algum Cabral querer dar a volta. Quem se habituou um dia aos fumos da pimenta, mais aprecia hoje os fundos do FEOGA. E quinhentos anos não é nada, no Portugal dos Cabrais.