Regresso a casa com duas evidências, para além dos 30 graus desta canícula.
A primeira é o ódio a Sócrates, que nem a sombra dum pudor disfarça. Anda por aí estúpido e estampado, na boca de jornalistas serviçais, de comentadores a soldo, de cínicos formadores de opinião, de políticos de terceira linha.
Repugna... mas não admira. Nenhum governante eleito foi tão caninamente massacrado, tão persistentemente caluniado, tão insidiosamente injuriado como ele o vem sendo, no desempenho do cargo. Por todos os peralvilhos da direita que se expõe, os próprios e os paus-mandados, herdeiros dos que tiveram o triste país por conta, e há trinta anos atrás ainda fediam ao mênstruo dos direitos de pernada. Até uma comissão dos deputados gastou semanas de tempo inutilíssimo, para descobrir se era verdade ou não, que Sócrates mentira ao insigne Parlamento. Porque ele é um mentiroso compulsivo.
Há-de haver uma razão para o despautério. E há!
É que apesar das muitas trapalhadas, das confusões e enganos, dos equívocos e das teimosias, dos erros e das desilusões, de todos os governos que há trinta anos tivemos, nenhum como os governos do partido de Sócrates meteu a mão na massa do que era urgente fazer, e ainda é: na educação, na saúde, na cultura, na justiça, na diplomacia económica, nos privilégios das corporações, nos atavismos mentais e até mesmo na miséria.
Poucas vezes conseguiu, outras errou, falhou mais que era devido. Mas quis mudar, e esse pouco é já bastante, na motivação do ódio e do cinismo. Porque no nosso país sempre ficou sem cabeça quem ousou pôr em questão o privilégio duns quantos, e a submissão dos demais.
A segunda evidência que trago para casa é que nos últimos dias reduziram-se num quarto os automóveis que circulam na cidade. Ganha o meu autocarro em rapidez. E se, mais que o preço do gasóleo, isso for um sinal de lucidez geral, oxalá possa manter-se, que vai haver eleições.