Com vénia ao dr. Luís Queirós
Presidente da Marktest e membro da ASPO Portugal
O discurso que Obama proferiu na Sala Oval, no passado dia 15 de Junho, a propósito do desastre ambiental da BP no Golfo do México, faz lembrar discursos de Carter em 1977. Foram eles proferidos entre os dois primeiros choques petrolíferos, numa época em que, tal como hoje, as questões de energia estavam na ordem do dia.
James Carter estava plenamente consciente da frágil situação energética americana, alertou para ela, quis resolvê-la. Mas não teve sucesso, e acabou por nem sequer ser eleito para um segundo mandato.
Reagan, que veio a seguir, beneficiou duma conjuntura bastante favorável a partir de 1980, o que veio aliviar a difícil situação energética do mundo. Foi o caso da redução do consumo de petróleo, do início da entrada em funcionamento de inúmeras centrais nucleares, e do contributo de novas bacias petrolíferas, no Mar do Norte, no Alasca e no Golfo do México. E não se pode esquecer que foi a partir de 1980 que o gás natural veio ocupar o lugar do petróleo nas centrais termo-eléctricas. Tudo isto contribuiu para fazer baixar fortemente o preço do crude nos 25 anos seguintes, e criar a ilusão de que tudo tinha voltado ao “normal”.
Obama está hoje confrontado com uma situação semelhante à da época de Carter, e vem repetir o mesmo tipo de discurso. Mas agora num contexto que se apresenta com perspectivas bastante menos promissoras. Já não existem as alternativas surgidas em 1977, o nuclear já não se mostra esperançoso, a produção de crude estagnou, e não existem novas áreas a explorar para compensar as quebras de produção. A "solução" que agora se apresenta é a revolução "verde", apoiada no desenvolvimento das energias renováveis, as quais têm perspectivas, custos e eficácia ainda mal conhecidos.
No seu discurso, Obama lembra a actual situação energética da América e o paradoxo que ela representa. Diz ele: ”O petróleo é um recurso finito; consumimos, no nosso país, mais de 20% do petróleo extraído a nível mundial e temos menos de 2% das reservas”. E põe, de forma desassombrada, o dedo na ferida : “Durante décadas percebemos que os dias do petróleo fácil e barato estavam contados, e falámos da urgente necessidade de escapar à nossa dependência dos combustíveis fósseis. Mas falhámos nesse propósito, e não fomos capazes de actuar com a urgência que se impunha. E não foi apenas pela acção dos "lobbies" petrolíferos, mas foi também pela nossa falta de coragem política e pela falta de franqueza em enfrentar o problema”.
Obama ainda acrescenta que “chegou a hora de fazer a transição para uma era de energia limpa. Sabemos que isso tem custos, mas que temos de enfrentá-los agora”. Mas parece desorientado sobre as acções a tomar, parece não saber o que fazer e espera por soluções: ”Existem muitas ideias, e espero ver pô-las em prática para resolver o problema. O que não podemos é ficar parados”. Faz um apelo à fé na América: “Se nós fomos capazes de produzir tanques e aviões na Segunda Grande Guerra, e colocámos um homem na Lua, teremos de ser capazes de enfrentar e resolver também o presente desafio”. E conclui invocando a Deus: “Esta não é, certamente, a última crise que América terá de enfrentar. Rezo por dias melhores”.
Desde que Dick Cheney, confrontado com a necessidade de alterar os hábitos americanos de consumo, exprimiu a opinião de que o “american way of life” é inegociável, a sociedade americana parece ter entrado numa espiral de cegueira colectiva, da qual só sairá perante algum choque imprevisível e certamente muito doloroso. Os ventos não correm de feição para a manutenção do “american way of life” E, tal como Carter, também Obama corre o risco de não vir a ser eleito para o segundo mandato.