Os recitais de vanguarda, com que a Antena 2 nos brinda a horas mortas, martelam horas a fio e podiam durar a eternidade. Seguem muito bem o ar do tempo.
A estética complexa, que os insufla e lhes dá forma, é feita de lamentos do camelo que perdeu a caravana, de risadas histéricas de hiena, do choro de cabritos desmamados, das estridências de cordas amotinadas, dos trinados de castrato que baralhou as pautas, dos uivos dum lobo à lua, do troar das cachoeiras no inverno, dos silvos de serpente enfurecida, do protesto de bichos no açougue, do tropear das cargas de cavalaria, da explosão dos cabos de aço que ultrapassam a tensão, do arrotar dum bêbado descomposto, do caos das discussões dos ciganos, do esbracejar de orquestras sem maestro, do rumorejo das folhas numa brisa, das ressonâncias de órgãos esquizofrénicos ou tímbales que enlouqueceram.
Seguem muito bem o ar do tempo. E mal por mal eu prefiro as estéticas do outro, que batutou quatro minutos de silêncio, até jorrarem aplausos do deslumbrado auditório.