quinta-feira, 29 de julho de 2010

O elefante branco

O mastodonte é pardo. E não parece, mas é, um elefante. É um elefante branco.
Os papagaios de serviço dizem que custou 18 milhões, porém não é verdade. Ficou por 96, que é uma conta calada.
O Museu de Arte Rupestre é o segundo museu de Portugal, em superfície coberta. Maior só o de Arte Antiga. E sobram-lhe ainda desassete quilómetros de área aberta e ar livre, que é património mundial não sei de quê. Como se o não fosse tudo o que há no mundo.
Os elefantes brancos, bichos raros, eram poupados às torturas dos cornacas, que destruíam o ânimo dos seus irmãos comuns, para os reduzir à escravatura e os transformar em catrapilos. E assim andavam por ali, na vida airada, ninguém sabia o que fazer com eles. Nem eles tinham nada que fazer.
É o caso deste museu. Vão inaugurá-lo amanhã, que já é tarde para o riscarem do mapa. Mas ninguém sabe o que fazer com ele. É o IGESPAR que pretende uma coisa, é o poder local que há-de ter outra, é o Instituto dos Museus que puxa para a direita, é o Turismo que lhe prefere a esquerda, é o Parque Natural que afinal acha que não, são empresários privados que lhes parece que sim, é a triste salgalhada à portuguesa e o destino nacional.
Dizem agora que vai ser gerido por uma sociedade anónima. Que é como quem diz, mordam-se para aí, mas à porta fechada.
Vão inaugurá-lo amanhã. Da América vai chegar o melhor que há no mercado, desde que cheire a tralha pós-moderna e às palhaçadas da cena contemporânea. Os cachets são matéria reservada, para não alvoroçar a gentinha ignorante que anda aí por ver andar os outros. No mundo dos farsantes é assim.
E com sorte talvez haja, lá no meio, uma parelha de auroques num lameiro, em ousado pas-de-deux de animação, num ecrã computorizado. Só para deixar umas luzes de como se deve interpretar a arte rupestre.
Depois disso desmancha-se a barraca, excelências e génios vão-se embora. Fica o património mundial, a flutuar ali numa bandeira. E a gentinha triste a olhar para ela, enquanto o sol lhe não comer a cor.

[Adenda: À última hora, inventou-se uma fundação para gerir a coisa, em lugar da sociedade anónima. A seu tempo se verá que só as moscas mudaram.]