segunda-feira, 30 de maio de 2011

Ponto de ordem

Não tenho particular interesse nesta disputatio, que não procurei, nem alimentarei mais. Por não lhe reconhecer bondade nem utilidade prática. E em que entrei mais num gesto de cortesia do que por outros motivos, neste contexto febril dum acto eleitoral engendrado por um estranho casamento de oposições parlamentares, que a uma voz derrubaram o governo. Com os custos que já se viram, e com os custos mais que traz no ventre.
Mas convirá centrar este exercício, por uma questão de clareza e de lisura:
1 – Estou muito longe de considerar a república de Weimar como uma ordem política que servia os interesses e aspirações dos trabalhadores alemães;
2 – Não disse, nem penso, que o ascenso do nazismo tenha ficado a dever-se aos comunistas alemães, mal feito fora;
3 – Disse apenas, e continuo a dizer, o que Thaelmann afirmou, num momento desgraçado e numa frase fatal: entre o nazismo e a social-democracia, “que venha Hitler!”
4 – Thaelmann foi aniquilado pelos nazis. Não desconheço, nem me é indiferente, nem menosprezo o sacrifício desse e doutros dirigentes comunistas alemães.
5 – Sobre o “momento Catroga”, cuja subtileza me deixou rendido: o que Catroga fez foi identificar Sócrates com Hitler, num assomo de inteligência, de compostura moral e de rigor de análise, que com muita justiça o inscreve na história. Eu não identifiquei ninguém com nada. Sustento apenas que a direcção dos comunistas alemães, no contexto da República de Weimar, levou os trabalhadores alemães ao engano, certamente involuntário. Ao sugerir-lhes que a social-democracia era igual ao nazismo, se não pior. Os eleitores alemães acabaram por eleger Hitler. E conforme concede o João Vasco, “estavam errados”. Mas isso serviu de muito pouco consolo aos 50 milhões de mortos que o nazismo vitimou.
6 – Pessoalmente, estou muito longe de considerar o PS um partido de virgens, e Sócrates um primeiro-ministro a tomar como exemplo. O que disse, e sustento, (no contexto dumas eleições saídas de tão estranho casamento parlamentar), é que “apesar das muitas trapalhadas… (…) dos erros e das desilusões, nenhum dos governos que há trinta anos tivemos meteu a mão na massa do que era urgente fazer, e ainda é: na educação, na saúde, na cultura, na justiça, na ciência, na diplomacia económica, nos privilégios das corporações, nos atavismos mentais, e até mesmo na miséria”. E nem disse que o governo conseguiu, disse apenas que meteu a mão na massa. Ao João Vasco, em lugar do meter a mão na massa da governação, agrada por certo mais este simples programa: o ódio a Sócrates, que a direita mais vil há seis anos demoniza, como pessoal e único responsável pelos males que nos desabam em cima, a nós e ao mundo inteiro. E como PS e PSD são uma e a mesma coisa, (na febre neo-liberal de desmantelar o Estado, de entregar a Saúde nas unhas dos privados, de destruir a Escola Pública, de arruinar a Segurança Social em benefício dos Seguros, de privatizar Serviços Públicos sob a falácia das vantagens da gestão privada), segue-se que a orientação que os comunistas têm para deixar aos eleitores que não acharem razões para votar no PC, é só uma: votar no PS ou no PSD é exactamente igual. Isto num momento em que de facto está em causa a manutenção ou a destruição do edifício democrático saído de Abril.
A isto chamo eu alienar o povo, levá-lo ao engano, que é aquilo por que saliva há muito tempo a direita mais vil. A isto chamo eu levar carneiros ao açougue.