quarta-feira, 16 de março de 2011

Mais vale tarde... 5 - Der Führer

(...)
Eu fora encarregado de acompanhar a excursão de propaganda do Führer na Renânia, e seguia-o diariamente por toda a parte, em companhia de cinquenta ou sessenta jornalistas nacionais e estrangeiros (…). Certa manhã deixámos Elberfeld-Barmen, pouco depois do almoço, com o carro de Hitler à frente, a caminho de Bonn. Chegámos lá pelas seis e meia da tarde. O Führer e o seu séquito foram jantar ao hotel. Depois de comer alguma coisa entrei no salão em que ele devia pronunciar um discurso naquela noite. Estava apinhado de gente. (…)
Na plataforma, uma banda tocava “Der Gute Kamerad”, “Heil dir in Siegerkranz”, e outras canções patrióticas. Volvidos cerca de três quartos de hora, um nazi de cabeça calva subiu à tribuna e, depois de acenar pedindo silêncio, anunciou que o Führer estava sendo detido por uma tempestade que rebentara sobre o Reno. Pediu à multidão que tivesse um pouco de paciência, e a banda, entre o entusiasmo geral, atacou “Die Wacht am Rhein”.
Decorrida mais meia hora, como o Führer não desse sinal de si, o mesmo homem voltou à tribuna e gritou que, a despeito de haver a tempestade redobrado de violência, Hitler acabava de telefonar de uma aldeia do vale renano, dizendo que chegaria em menos de meia hora. “Er kommt durch den Sturm”. Ele vem no meio da tempestade! Ele nunca nos desapontará!
A banda tornou a tocar “Der gute Kamerad” e a multidão pôs-se em pé. Quando ela se achava em estado de expectativa febril, o Führer, que todo o tempo estivera sentado sossegadamente no café em frente, entrou, metido no seu impermeável pardo. Vinha encharcado e enlameado dos pés à cabeça. A multidão delirante aclamou o Führer, impassível durante cinco minutos, estrugindo em Sieg-Heils. Um homem de meia-idade, que estava sentado na fila da frente, perto da mesa da imprensa, enxugou as lágrimas dos olhos e comentou para mim: “Alles tut er für das deutsche Volk!” Ele faz tudo pelo povo alemão!
Na verdade, era aí que residia o segredo: não em Hitler, mas no povo alemão. Este povo, sordidamente humilhado, sem esperanças, reduzido à fome e à miséria, cuja mocidade sentia a decepção e a inutilidade da sua existência, estava pronto para tudo, para todos os expedientes, por mais absurdos e insensatos, desde que se pudesse libertar da escravidão imposta em Versalhes. O povo alemão tinha perdido a fé no jogo parlamentar e nos métodos empregados pelos diplomatas para aliviar o fardo de Versalhes, quando surgiu Hitler, comportando-se “como um homem de perna de pau, que estivesse com um ataque epiléptico em cima dum telhado de zinco”. (…)
No decurso daquela conversação na Casa Parda de Munique, o Führer revelou o seu intuito de rearmar o Reich, destruindo a União Soviética, “sob os aplausos de todo o mundo civilizado”, e de reduzir os judeus à condição de indesejáveis em toda a parte. “Eu prometo tornar a vida impossível para os judeus na Alemanha, e não descansar enquanto não houver anulado a influência dos judeus em toda a Europa – e no mundo. Sim, juro que há-de vir o dia em que os Estados Unidos verão os plutocratas judeus de mão estendida à porta das igrejas cristãs, pedindo esmola. Eles foram a desgraça da Alemanha. Hão-de pagar bem caro os seus crimes!”

(...)