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A Alemanha baseara todos os seus cálculos numa guerra fulminante e numa vitória rápida. Ao princípio, a sua provisão de material bélico mal bastava para sustentá-la durante um ano de campanha, nas duas frentes. Os aliados, por conseguinte, poderiam ter obrigado o Kaiser a capitular antes dos fins de 1915, estabelecendo o bloqueio económico. Mas isto importava abrir mão dos mais gordos proventos da guerra: os que trazia o comércio de contrabando.
Durante os três primeiros anos da guerra, o Reich recebeu sem cessar fornecimentos através da Holanda, Suíça e dos países escandinavos, em especial de algodão, sem o qual não poderia lutar um só dia mais. Isto prolongou-se até surgir o protesto indignado dos Estados Unidos: a Inglaterra, o maior inimigo da Alemanha, estava-lhes roubando o mercado europeu.
O capitalismo alemão tão pouco se havia esquecido do seu bolso: até ao começo de 1917, as fundições Krupp de Essen enviavam mensalmente 250.000 toneladas de aço ao Comité des Forges da França, através da Suíça.
Além do pagamento em ouro, uma das cláusulas dessa transacção era que os aviadores franceses deviam abster-se de bombardear as minas, os altos fornos e as fábricas de preparação metalúrgica do distrito de Longwy, ocupado pelos alemães desde o começo da guerra. Carregamentos de níquel vindos da Caledónia com destino à Alemanha, apreendidos por destroyers franceses no alto mar, e trazidos para os portos de Brest e Cherburgo, foram mandados restituir pelo governo francês e alcançaram Bremen, sem mais incidentes. Representantes do trust de indústrias químicas alemãs, das fábricas de cobre suíças, de Vickers, Krupp, Schneider-Creusot e do Comité des Forges reuniram-se em Viena, no momento em que os exércitos se engalfinhavam numa luta de morte na lama da Flandres. O seu propósito único era o de inventar meios e modos de fazer com que a guerra seguisse lucrativamente o seu curso.
On croyait mourir pour la patrie, on mourait pour les industriels - disse Anatole France ao ter conhecimento da resposta do senador Béranger, aos que indagavam dele por que razão o distrito metalúrgico de Longwy não fora retomado logo no início da guerra, achando-se desprotegido pelos alemães, e com os franceses a dois passos dali. A causa de não se ter envidado nenhuma tentativa para recapturar Thionville era que isto levaria a guerra prematuramente a termo. Pois a ocupação de Thionville, declarava o senador, teria reduzido os alemães a sete milhões de toneladas de aço pobre por ano. Toda a produção ficaria paralisada. A captura de Thionville faria com que a guerra terminasse imediatamente. E era isto que se queria impedir a todo o custo.
O general Sarrail, comandante das forças da Lorena, maquinou, em 1915, um plano estratégico para conquistar, ou então destruir o distrito de Briey, onde a Alemanha explorava os altos fornos tomados ao Comité des Forges. Quando o comandantre supremo, Joffre, teve notícia da projectada ofensiva, Sarrail foi chamado a Paris, avistou-se com Poincaré, presidente da República, e o plano foi arquivado.
Graças ao minério francês, (...) pôde a Alemanha, durante quatro anos, inundar o oriente e ocidente, por terra e por mar, com rios de aço. Em troca dos magnetos para motores de aviões, enviados pela Alemanha, a França mandava bauxite, ingrediente indispensável na manufactura de alumínio para zepelins. O terrível arame farpado que os ingleses estenderam em Ypres e no Somme, e que foi uma armadilha mortal para a Guarda Prussiana, era fabricado pelos Drahtwerke de Opel e Cia, e chegava à Inglaterra pelo caminho da Holanda. A Austrália embarcava sebo para a Alemanha via Noruega e Dinamarca; os estabelecimentos do Estreito, copra; Ceilão, chá; o país de Gales, coque e carvão, alcatrão, amoníaco e glicerina, tudo em navios ingleses. (...)
A entrada dos Estados Unidos na guerra tornava certa a vitória final no front. Surgira no horizonte um outro perigo, que ganhava contornos cada vez mais precisos: o novo adiamento da paz ameaçava provocar uma revolução social. Só quando as classes superiores reconheceram a iminência dum desastre irreparável para a clique governante de banqueiros e mercadores da morte, foi que se instituiu um comando supremo único para todos os fronts, e, a instâncias dos Estados Unidos, se começou a aplicar a sério o bloqueio económico. A Alemanha percebeu imediatamente que tinha chegado o seu fim. Lançou mais uma última ofensiva desesperada, e acabou por ceder. (...)
Foi então que se assinou o Armistício!